segunda-feira, 2 de maio de 2011

319- Direitos Humanos 11 - Liberdades físicas 1

TEXTO ESCRITO E PUBLICADO ORIGINALMENTE EM 1991


José Luiz Quadros de Magalhães

5.2 AS LIBERDADES FÍSICAS



5.2.1 Liberdades de locomoção



A. Esmein considera liberdade de locomoção e a segurança individual como a liberdade individual stricto sensu, que protege o indivíduo de prisões e atentados à sua integridade física e moral.51

A Constituição Federal de 1988 assegura essa liberdade fundamental no art. 5º, inciso XV, ao determinar que em tempo de paz qualquer pessoa pode locomover-se livremente no território nacional, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. Entretanto, como todos os direitos e liberdades individuais, também a liberdade de locomoção terá um limite, que será sempre o direito do outro. Dessa forma, ninguém poderá ser cerceado em sua liberdade de locomoção se não tiver violado o direito de alguém. A Constituição, por esse motivo, determina no inciso LXI que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar definidos em lei”.

Esse dispositivo constitui uma importante evolução em relação aos textos de 1967 e 1969. O art. 153, § 12, da Emenda n. 1 de 1969 determinava que ninguém poderia ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade competente. Note-se a expressão “autoridade competente”, deixando o legislador infraconstitucional livre para determinar qualquer autoridade. Não existe a garantia da rigidez constitucional neste caso, uma vez que pela lei infraconstitucional qualquer autoridade pode ser competente para a prática de tal ato. A Constituição de 1988 é mais precisa ao determinar que somente a autoridade judiciária competente (o juiz competente) pode expedir uma ordem escrita e fundamentada de prisão.

Diversos outros incisos do art. 5º vêm oferecer proteção à liberdade de locomoção, como o inciso LXII, que obriga que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre sejam comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; o inciso LXV, que determina o relaxamento imediato da prisão ilegal pelo juiz; e o inciso LXVII, que proíbe a prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.

Duverger escreve que “a liberdade significa que cada homem pode pensar, se expressar e trabalhar como ele queira, e a liberdade dos outros é o único limite para a liberdade de cada um”.52 Esse princípio, aplicado ao presente artigo e incisos em estudo, significa que ninguém poderá ser preso se não tiver ofendido o direito do outro, e mesmo que isso ocorra o cerceamento da sua liberdade de locomoção só poderá ocorrer depois de legalmente comprovada a ofensa, ou em caso de flagrante delito, que não deixa dúvidas com relação à autoria da ofensa.

O inciso LXVIII do art. 5º da Constituição de 1988 traz a garantia processual do habeas corpus. Não basta a proclamação dos direitos individuais, pois são constantes as ameaças e as violações a eles, o que torna necessária a criação de garantias reais. A nova doutrina entende que a simples declaração de certos direitos não é suficiente para garantir a sua eficácia. “Tal compreensão leva à aceitação de que a verdadeira garantia das disposições fundamentais consiste em sua proteção processual”.53

Dessa forma, temos o art. 5º, inciso LXVIII que cria a primeira garantia processual que, justamente, vem assegurar a liberdade de locomoção:



“Art. 5º ..................................................................................................



LXVIII – Conceder-se-á Habeas Corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.

O habeas corpus é medida de proteção da liberdade de locomoção, ou liberdade de ir e vir. É proteção de liberdade física do homem e, sendo assim, só pode ser concedido em favor de pessoas naturais, nunca em favor de pessoas jurídicas, podendo ser liberatório ou preventivo.54 O habeas corpus é garantia processual que não exige formalidades processuais. Qualquer pessoa pode requerê-lo, não havendo necessidade de, neste caso específico, de representação por advogado, sendo dispensada também a petição datilografada, podendo o habeas corpus ser dirigido ao juiz competente por meio de petição, na qual deve constar a identificação do preso, do coator ou do praticante da ilegalidade, e qual a ilegalidade ou abuso de poder. Essa proteção processual será não somente contra a ilegalidade ou o abuso de poder de autoridade, mas também de ilegalidade contra a liberdade de locomoção praticada por particulares.

Escreve Magalhães Noronha:



“É o habeas corpus requerido em petição, desnecessária sendo a intervenção de advogados, como já se frisou. Se o coator ou paciente for incapaz, deverá o juiz nomear-lhe curador que acompanhe o processo, nomeação que recairá em advogado. É mister contenha a petição o nome da vítima da violência. Não obstante, é possível que o impetrante não possa identificá-lo pelo nome; fá-lo-á por outros meios, dando sua antonomásia, residência, profissão, características, enfim, individualizando-o, que é o que a lei quer. Necessário também é a designação da autoridade coatora”.55



Na Constituição dos Estados Unidos da América, os direitos individuais são encontrados nas dez emendas que constituem a chamada Declaração de Direitos (Bill of Rights).56

A Emenda n. VIII, estabelece:



“Não se exigirão fianças exageradas, não se imporão multas excessivas, nem se infligirão penas cruéis e desusadas.”57



O objetivo da fiança é oferecer ao acusado de delito criminal a possibilidade de recuperar a sua liberdade de locomoção. Entretanto, o limite do interesse de um acusado tem como limite o interesse público.58

A Constituição da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, de 7 de outubro de 1977, tratava dos direitos individuais juntamente com os chamados direitos sociais no Capítulo VII, que se refere aos “Direitos, Liberdades e Deveres Fundamentais dos Cidadãos da URSS”. O direito de locomoção se encontra resguardado no art. 54:



“É garantida aos cidadãos da URSS a inviolabilidade pessoal. Ninguém pode ser preso a não ser em conseqüência de decisão judicial ou com sanção do procurador.”59



Diferentemente da Constituição dos Estados Unidos da América e a da União Soviética, a Constituição de Portugal trata do direito de locomoção de forma mais detalhada e precisa:



“Art. 27 ........................................................................................



1 – Todos tem direito à liberdade e a segurança.

2 – Ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em conseqüência de sentença judicial condenatória pela prática de ato punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.

3 – Excetua-se deste princípio a privação de liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determina nos casos seguintes:



a) prisão preventiva em flagrante delito ou por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponde pena maior;

b) prisão ou detenção de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão;

c) prisão disciplinar imposta a militares, com garantia de recurso para o tribunal competente;

d) sujeição de um menor a medidas de proteção, assistência ou educação em estabelecimento adequado, decretadas pelo Tribunal Judicial competente;

e) detenção por decisão judicial em virtude de desobediência a decisão tomada por um tribunal ou para assegurar o comparecimento perante a autoridade judicial competente.



4 – Toda pessoa privada da liberdade deve ser informada imediatamente das razões da sua prisão ou detenção.

5 – A privação da liberdade contra o dispositivo na Constituição e na Lei constitui o Estado no dever de indenizar o lesado nos termos que a Lei estabelece.”60



A Constituição de Portugal, como podemos ver, trata da matéria de forma muito detalhada, reservando ainda o art. 28, itens 1, 2, 3 e 4 para tratar de prisão preventiva, e o art. 31, que prevê a garantia processual do habeas corpus:



“Art. 31. .........................................................................................



1 – Haverá Habeas Corpus contra o abuso do poder por virtude de prisão ou detenção ilegal, a interpor perante o Tribunal Judicial ou Militar consoante os casos.

2 – A providência de Habeas Corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.

3 – O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de Habeas Corpus em audiência contraditória.”



A Constituição da Espanha61 sancionada em 27 de dezembro de 1978 e publicada no dia 29 seguinte, trata dos Direitos Fundamentais e das Liberdades Públicas no Capítulo II, Seção I, e do Direito de Locomoção no art. 17, itens 1 a 4. Como a de Portugal a Carta espanhola trata de forma mais detalhada esse direito, porém de forma mais sucinta. O art. 17, itens 2, 3 e 4, dispõe sobre a liberdade de locomoção com a seguinte redação:



“Art.17...................................................................................................



1 – A prisão preventiva não poderá durar mais do que o tempo estritamente necessário para a realização das averiguações tendentes ao esclarecimento dos fatos e, em qualquer caso, no prazo máximo de setenta e duas horas o detido deverá ser posto em liberdade ou à disposição da autoridade judicial.

2 – Toda pessoa detida deve ser informada de forma imediata, e de modo que lhe seja compreensível, dos seus direitos e das razões da detenção, não podendo ser obrigada a prestar declarações. É garantida a assistência de advogado ao detido nas diligências policiais e judiciais, nos termos que a lei estabelecer.

3 – A lei regulará um processo de Habeas Corpus com vistas à imediata colocação à disposição do juiz de toda pessoa detida ilegalmente. A lei também determinará a duração máxima da prisão provisória.”

Ainda sobre a liberdade de locomoção, a Constituição espanhola assegura no art. 19 o seguinte:



“Os Espanhóis têm o direito de escolher livremente a sua residência e de circular no território nacional.

Todos têm o direito de entrar e sair legalmente da Espanha nos termos que a lei estabelecer. Este direito não poderá ser limitado por motivos políticos ou ideológicos.”



É importante notar como é ressaltado nesse artigo que o direito de locomoção “não poderá ser limitado por motivos políticos e ideológicos”. Essa afirmação vem assegurar, resguardar, um outro direito individual fundamental, que estudaremos mais adiante, que é o direito à liberdade de consciência política, filosófica ou religiosa, e o direito de expressão dessa consciência política, filosófica ou religiosa, seja ela qual for.



5.2.2 Segurança individual ou integridade física e moral



André Hauriou62 não classifica como outros a segurança individual juntamente com a liberdade de ir e vir. Ele estabelece uma diferenciação entre estes os direitos individuais, afirmando que o direito de ir e vir se refere à liberdade física do indivíduo se opondo à escravidão e à servidão, enquanto a segurança individual significa o direito de não ser preso sem julgamento.

Preferimos, entretanto, estabelecer uma outra forma de diferenciação desses dois direitos fundamentais que, muitas vezes, são colocados com o mesmo significado. Para nós, o direito à segurança individual se opõe a qualquer forma de atentado à integridade física, mental ou moral, a torturas ou qualquer outra atitude de agressão à pessoa humana, enquanto o direito de locomoção se opõe a qualquer privação da liberdade de ir e vir, impedindo a prisão de qualquer pessoa, fora dos casos estabelecidos em lei. Portanto, enquanto o direito de locomoção assegura o direito de ir e vir, o direito a segurança individual assegura a integridade física, mental e moral da pessoa humana.

A Constituição de 1988 assegura no art. 5º, caput, cinco direitos básicos: à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Todos os incisos do art. 5º não passam de desdobramento desses cinco direitos, que são o núcleo dos direitos fundamentais individuais.

São diversos os incisos do art. 5º que protegem a integridade física e moral da pessoa. O inciso III proíbe a tortura e o tratamento desumano ou degradante, estabelecendo o inciso XLIII que será crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

Ainda em relação à segurança individual, no art. 5° a Constituição proíbe penas de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis (inciso XLVII); estabelece que a pena deverá ser cumprida em estabelecimentos distintos de acordo com a natureza do delito, idade e sexo do apenado (inciso XLVIII); garante expressamente a integridade física e moral dos presos (inciso XLIX); assegura que o preso será informado de seus direitos inclusive o de permanecer calado, e receberá assistência da família e de advogado (inciso LXIII); e determina que o preso terá direito à identificação dos responsáveis por sua prisão.

As Emendas IV, V, VI e VIII da Constituição dos Estados Unidos da América “constituem uma declaração de direitos das pessoas acusadas. Na maior parte foram compiladas das Declarações de Direitos (Bill of Rights), das antigas Constituições Estaduais e a mais de um respeito representam um distinto avanço sobre o direito inglês da época e, na verdade, por muitos anos adiante”.63 A Emenda IV fala brevemente da segurança individual no sentido que aqui adotamos: “Não será infringido o direito do povo à inviolabilidade de suas pessoas, casas, papéis e haveres contra busca e apreensões irrazoáveis.” Entretanto, segundo Corwin, a principal importância dessa emenda atualmente



“deriva da doutrina primeiro adotada pela Corte Suprema em 1886, no caso Boyd v. United States, em que o dispositivo acima deve ser lido conjuntamente com a cláusula de auto-incriminação da Emenda V, de modo que qualquer apreensão de papéis ou coisas não poderão, de acordo com a Quinta Emenda, ser aceitos como prova por qualquer tribunal federal contra a pessoa de quem foram apreendidos”.64



Não é, pois, o sentido que atenderia o direito individual fundamental que estudamos no presente tópico.

A Constituição da União Soviética não faz também referência direta à integridade física e moral da pessoa humana. Trata no art. 54 da inviolabilidade pessoal, juntamente com a liberdade de locomoção, conforme visto anteriormente.

As Constituições de Portugal e da Espanha tratam de forma clara e objetiva esse direito individual. A Constituição portuguesa estabelece no art. 25 o direito à integridade física. É importante ressaltar que o texto português estabelece em outro artigo o direito à liberdade e à segurança, onde se refere à liberdade de locomoção, conforme já foi visto. Entretanto, é bom recordar que quando enfocamos aqui à segurança pessoal ou individual nos referimos à integridade física e moral do ser humano.

O art. 25 da Carta Portuguesa de 1976, com o texto revisado, tem a seguinte redação:



“Art. 25. ................................................................................................

1 – A integridade moral e física dos cidadãos é inviolável.

2 – Ninguém pode ser submetido a tortura nem a tratos ou penas cruéis, degradantes ou desumanas".65



Nesse mesmo sentido a Constituição da Espanha estabelece no art. 15 do Capítulo II, seção I, o seguinte:



“Art. 15. Todos têm direito à vida e a integridade física e moral, e em caso algum podem ser submetidos a tortura ou a penas ou tratos desumanos e degradantes. Fica abolida a pena de morte, salvo o que possam dispor as leis penais militares para tempo de guerra.”66



5.2.3 Inviolabilidade de domicílio



As Constituições brasileiras estabeleceram de maneiras diferentes o direito à inviolabilidade de domicílio. A Constituição do Império de 1824 determinava que, sendo noite, só se poderá entrar na casa, sem o consentimento do morador, em caso de incêndio ou inundação, deixando para o legislador ordinário estabelecer os casos de permissão durante o dia. As Constituições de 1891 (primeira da República), 1934 e 1946 acrescentaram aos casos acima descritos a hipótese de crime para acudir vítimas, deixando também para o legislador ordinário estabelecer os casos em que se poderá penetrar na casa durante o dia.

A Constituição de 1967 estabelece no § 10 do art. 150: “A casa é o asilo inviolável. Ninguém pode penetrar nela, à noite sem consentimento do morador, a não ser em caso de crime ou desastre, nem durante o dia, fora dos casos e na forma que a lei estabelecer.”

É importante notar que essa redação, mantida pela Emenda Constitucional n. 1 de 1969, não diz, a exemplo das Constituições citadas anteriormente, que a permissão para penetrar na residência à noite, em caso de desastre ou crime, será para acudir as vítimas. Assim, amplia os casos de entrada à noite, pois, ocorrendo crime dentro de casa, pode-se penetrar nela, não sendo mais necessária a existência de vítimas a serem acudidas.

O texto da Constituição de 1937, seguindo uma linha autoritária, estabeleceu simplesmente que estava assegurada a inviolabilidade de domicílio “salvas as exceções expressas em lei" (art. 122, § 6º, da Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de novembro de 1937).

A Constituição de 1988 traz importantes modificações em relação aos textos anteriores, conforme no art. 5º, inciso XI:



“Art. 5º . ................................................................................................

XI – a casa é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.”



O texto em vigor oferece a garantia da rigidez constitucional quando estabelece expressamente as hipóteses em que se poderá penetrar no domicílio durante a noite e durante o dia. Ao contrário do texto anterior, que estabelecia somente os casos durante a noite, deixando o legislador infraconstitucional livre para estabelecer os casos em que se poderia penetrar durante o dia, a Constituição de 1988 permite a entrada na casa sem consentimento do morador somente nos casos de flagrante delito, desastre e para acudir vítimas durante a noite, acrescentando a essas hipóteses, durante o dia, o mandado judicial.

É importante notar outra modificação do texto atual em relação ao de 1969. A Emenda n. 1 de 1969 se referia a crime durante a noite, enquanto a Constituição de 1988 se refere a flagrante delito. Temos, portanto, que a nova Constituição de certa forma ampliou as hipóteses ao utilizar a expressão flagrante delito. Quando a Emenda n. 1/69 se referia a crime, entendemos ser crime que estivesse ocorrendo dentro da casa, que estivesse na iminência de acontecer ou que já tivesse acontecido, sempre dentro de casa. Na hipótese de um crime que ocorresse fora de casa durante a noite, e logo em seguida ocorresse uma perseguição ininterrupta, indo o criminoso se refugiar dentro da casa, pelo Texto Constitucional de 1969 deduz-se que não poderia o perseguidor penetrar no domicílio sendo noite. Na Constituição de 1988, a conclusão a que podemos chegar é diferente. O novo texto fala em “flagrante delito” e não em “crime”. O flagrante delito está caracterizado quando a pessoa surpreendida está prestes a cometer o crime, está cometendo o crime, acaba de praticar o crime, é encontrado no local com objetos que indicam ter sido a autora do crime, ou ainda durante a perseguição ininterrupta. Dessa forma, quando o Constituinte entendeu como melhor utilizar a expressão flagrante delito no lugar de “crime”, permitiu que na hipótese levantada também se possa penetrar no domicílio.

Na Constituição dos Estados Unidos, encontraremos a inviolabilidade de domicílio na mesma Emenda n. IV: “O direito do povo à inviolabilidade de suas pessoas, casas, papéis e haveres contra busca e apreensão arbitrárias não poderá ser infringido”.

A Constituição da União Soviética dispõe, no art. 55:



“É garantida ao cidadão da URSS a inviolabilidade do domicílio. Ninguém tem o direito de entrar sem fundamento legal em qualquer domicílio contra a vontade dos seus moradores.”



O texto soviético, pois, não limita a ação da lei ordinária no estabelecimento dos casos em que se poderá penetrar no domicílio, como o faz, por exemplo, a Constituição brasileira.

Semelhante à proteção oferecida pela Constituição do Brasil é a que encontramos nas Constituições de Portugal e Espanha. O art. 18 da última, ao lado de outras garantias da intimidade estabelece:



“Art.18..................................................................................................

1............................................................................................................

2. O domicílio é inviolável. Ninguém poderá nele entrar e nenhum busca poderá fazer-se sem o consentimento do seu titular ou sem decisão judicial, salvo em caso de flagrante delito”.



A Constituição de Portugal dispõe, no seu art. 34:



“Art. 34. (Inviolabilidade do domicílio e da correspondência)

1 – O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis.

2 – A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstas na lei.

3 – Ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento.”



De maneira diferente estabelece a Constituição da Itália:



“Art. 14. O domicílio é inviolável. Nele não podem ser efetuadas inspeções ou perquirições ou seqüestros, salvo nos casos e formas estabelecidas por lei, segundo as garantias prescritas para a tutela da liberdade pessoal.

As averiguações e inspeções por motivos de saúde e de incolumidade pública ou para fins econômicos e fiscais são regulamentados por leis especiais.”



Ao contrário da Constituição do Brasil, que estabelece os casos em que se poderá entrar na casa durante o dia e durante a noite; a de Portugal que proíbe a entrada no domicílio à noite reduzindo o campo de atuação da lei ordinária, que só poderá determinar os casos durante o dial; e a da Espanha, que já determina que a entrada no domicílio dos cidadãos contra sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, ou caso de flagrante delito, o texto italiano dá mais liberdade ao legislador comum:



“O art. 14 da Constituição, após afirmar taxativamente que ‘o domicílio é inviolável’, admite que se possam realizar inspeções ou pesquisas ou buscas, apenas nos casos e modos estabelecidos pela lei, segundo as garantias prescritas para a tutela da liberdade pessoal (art. 13), acrescendo que os exames e inspeções por motivos sanitários ou de incolumidade pública ou para fins econômicos e fiscais são regulados por leis especiais”.67

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