terça-feira, 3 de maio de 2011

329- Direitos Humanos 19 - garantias processuais 2

TEXTO PUBLICADO ORIGINARIAMENTE EM 1991.


AS CITAÇÕES BIBLIOGRAFICAS SERÃO TODAS PUBLICADAS AO FINAL DESTA SÉRIE DE TEXTOS.



c) Mandado de injunção



• Conceito e objeto – O mandado de injunção é, sem dúvida, uma das mais importantes criações da Constituição de 1988, uma vez que vem possibilitar a concretização dos dispositivos constitucionais que dependem de norma regulamentadora. Várias foram as normas constitucionais de Constituições passadas que ficaram sem regulamentação e, por este motivo, não influíram na ordem jurídica nacional. Essas normas são principalmente as referentes aos direitos sociais, e isto consiste em outra qualidade do mandado de injunção: ao contrário das garantias processuais da Constituições passadas que a exemplo do habeas corpus e do mandado de segurança, só protegiam direitos individuais, o mandado de injunção vem proteger também os outros direitos constitucionais, como os direitos sociais e políticos.

O art. 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal, dispõe: “Conceder-se-á Mandado de Injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.”

Esse dispositivo guarda íntima relação com a ação de inconstitucionalidade por omissão, regrada pelos arts. 102, I, q, e II, 1, e 105, I, h, da Constituição, pois embora tenham conteúdos, objetos e finalidades um pouco diferentes, cuidam do mesmo assunto, que é a omissão normativa.169

O objeto do mandado de injunção é suprir a carência da norma regulamentadora, possibilitando que o sujeito do direito que depende de regulamentação possa usufruir deste. É bom notar que, como a ação de inconstitucionalidade por omissão, o mandado de injunção também é uma forma processual de controle da constitucionalidade, pois supre, para aqueles que o impetrarem, a omissão inconstitucional.

José Afonso da Silva declara:



“Em princípio, o exercício das liberdades constitucionais independe de normas regulamentaras. Elas são conferidas por regra, em normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Se alguma normatividade é prevista, normalmente será para restringir o alcance da norma e não para integrar sua eficácia. Pois aí se situam as normas de eficácia contida. Mas há inúmeros direitos constitucionais e eventualmente até liberdade cujo exercício requer alguma forma de regulamentação por lei ou outra providência do Poder Público. Por exemplo, é garantida, na forma de lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias (art. 5º, VI, e garantia de uma liberdade dependente da forma da lei); é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa às entidades civis e militares de internação coletiva (art. 5º, VII); a criação de associações e na forma da lei, a de cooperativas não dependem de autorização (a criação de cooperativas depende de lei, art. 5º, XVIII) [...]; ‘e direito do trabalhador a relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos da lei complementar ... (art. 7º, I); salário mínimo, fixado em lei com os requisitos previstos no art. 7º, IV, adicional para atividades penosas [...], na forma da lei (art. 7º, XXIII) etc.; os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a ... (art. 201)”.170



Temos nos exemplos acima citados casos de dispositivos constitucionais que dependem de normas regulamentadoras. É importante notar que essa garantia do mandado de injunção se aplica não apenas aos direitos individuais, mas também aos direitos sociais citados e ainda a outros direitos constitucionais, nos termos do inciso LXXI art. 5º, além das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Quando se fala em norma regulamentadora, não se está falando em regulamentação através das leis, mas qualquer ato proveniente de ‘atividades internas da Administração Pública, ou que dela depende, quer sejam funcionários, quer sejam agentes de qualquer dos Três Poderes e até mesmo de particulares”.171

Quanto ao alcance da ordem de injunção, este é muito bem definido por Ulderico Pires dos Santos:



“O que o Poder Judiciário deve fazer no exercício de seu poder jurisdicional é examinar se o direito subjetivo do postulante da injunção está sendo postergado em face da apatia de quem tem o dever de regulamentar. Se se convencer de que o ato omissivo está realmente lhe causando lesão, marcará prazo para o responsável pela violação fazer o regulamento, de modo a poder o titular do direito entrar no seu exercício, sob pena de providência ser tomada pelo poder jurisdicional.

Esgotado o prazo para a autoridade executiva ou legislativa tomar a providência que lhe compete, sem que o faça, deverá ser expedido o mandado de injunção assegurando ao impetrante o direito que reclama.

Se houver recalcitrância do devedor da prestação, esta será convertida em indenização por perdas e danos, como temos salientado”.172



Temos então que, através do mandado de injunção, qualquer pessoa física ou jurídica portadora de direito constitucional que depende de regulamentação pode consegui-lo. Após o Poder Judiciário determinar que o responsável pela norma regulamentadora a elabore em prazo marcado, se isso não for feito o Poder Judiciário suprirá a omissão para aquele caso concreto, tendo nesse caso o efeito inter-partes.



• Sujeito passivo – Vamos recorrer aos claros ensinamentos de José Afonso da Silva sobre o tema:



“A pessoa ou entidade contra quem se impetra o Mandado de Injunção – o impetrado – será aquela que corre a obrigação de prestar o direito, liberdade ou prerrogativa, pretendidos pelo impetrante. Em se tratando de liberdade ou prerrogativa, objeto de injunção, parece que o impetrado só poderá ser uma pessoa de direito público. [...] Muitos direitos sociais, como vimos, irão de ser prestados concretamente pelo Poder Público (direito à saúde, direito à educação, direito à cultura); nestes casos a Constituição reconhece competência comum cumulativa (art. 23) da União, Estados, Distritos Federal e Municípios, portanto qualquer dessas entidades poderá ser impetrada em Mandado de Injunção, talvez comporte até litisconsórcio passivo nessa situação. [...] Em matéria de direito dos trabalhadores, a parte obrigada a cumprir em concreto o direito pleiteado é o patrão do impetrante, logo ele será o impetrado.

É possível haver litisconsórcio passivo especialmente em Mandado de Injunção impetrado por sindicatos em defesa de direitos constitucionais da categoria profissional. Claro que, em tal caso, será proposto contra todas as empresas que empregam a categoria do sindicato ou sindicatos impetrantes. Não cabe litisconsórcio passivo entre particulares e o Poder Público. No máximo será admissível que se dê ciência ao Poder Público competente para elaborar a norma regulamentadora, mas a sentença proferida contra particular não será exeqüível contra ele, pois não é parte no feito”.173



• Legitimidade ativa – Será sujeito ativo o titular do direito que depende de regulamentação, podendo haver litisconsórcio ativo facultativo quando o mesmo direito pertencer a vários interessados, o que pelas características dos direitos protegidos será comum acontecer, devendo ser o mesmo fundamento contra o mesmo obrigado.

Será admitida também a representação do interessado pela associação na defesa de seus membros nos termos do art. 5º, XXI, da Constituição Federal, assim como poderá ocorrer substituição processual,



“chamada derrogação anômala, em derrogação do art. 6º do Código de Processo Civil, para o caso, na defesa de direitos ou interesses de sua categoria profissional, por força do disposto no art. 8º, III, que declara caber ao sindicato ‘a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria inclusive em questões judiciais ou administrativas’, cumprindo esclarecer que, ao falar de direitos e interesses coletivos e individuais, não se está usando essas expressões no sentido de que o sindicato poderá ingressar em juízo para pleitear direitos e interesses tanto da coletividade de seus membros como direitos de cada um deles individualmente. E também aqui poderá haver litisconsórcio facultativo entre mais de um sindicato, desde que o fundamento, o objeto e a causa de pedir sejam idênticas”.174



• Rito processual – O mandado de injunção, dada a sua natureza, terá rito equivalente aos remédios processuais constitucionais, admitindo-se a possibilidade de se conceder liminares. “Enquanto não editada a lei regulamentando o seu procedimento, o Mandado de Injunção poderá ser admitido e processado, naquilo que for compatível, em consonância com a disciplina procedimental estabelecida para o Mandado de Segurança”.175

É, também, a doutrina que assim entende: “Para esse efeito, há de ser demonstrado o fumus boni iuris e o periculum in mora, tendo em vista os parâmetros do direito comparado e o confronto da doutrina e jurisprudência vigente no País, bem utilizáveis pela via de conhecimento analógico”.176

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