domingo, 1 de janeiro de 2012

952- PODER MUNICIPAL 13 - OS DIREITOS À EDUCAÇÃO E À SAÚDE COMO DIREITOS DEMOCRÁTICOS AUTOGERIDOS POR AUTONOMIAS CONSTITUCIONAIS

PARA CITAR: MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Poder Municipal, paradigmas para o estado constitucional brasileiro, Editora Del Rey, 1997, Belo Horizonte, pp. 107-108.

11 OS DIREITOS À EDUCAÇÃO E À SAÚDE COMO DIREITOS DEMOCRÁTICOS AUTOGERIDOS POR AUTONOMIAS CONSTITUCIONAIS
A nova teoria que tentamos estabelecer dos direitos funda­mentais, ou dos direitos humanos, na perspectiva constitucional, partindo da teoria da indivisibilidade dos direitos humanos, leva­-nos a propor tratamento diferenciado dos direitos fundamentais à saúde e à educação, direitos que, como vimos, são essenciais à existência e continuidade do processo democrático nas comple­xas sociedades contemporâneas.
Esses direitos são garantias do exercio da democracia e como tal devem estar desvinculados do governo, seja em que nível for, devendo ser geridos por autonomias constitucionais autogestionárias.
A ideia não é totalmente nova, pelo menos no que se refere às universidades, pois remonta às suas origens no século XII e XIII, sendo consagrada na legislação brasileira desde 1917 e garantida no Texto Constitucional no art. 207, que mantém a autonomia das universidades como verdadeira garantia de per­manência e evolução do processo democrático, uma vez que têm a função de produzir e divulgar o conhecimento nas suas mais variadas perspectivas, de forma livre e plural.
Aliás, esse é o sentido originário da autonomia das univer­sidades: desvincular a produção e divulgação dos saberes dos gover­nos e dos “mercados”, que podem utili-los no sentido de manutenção do poder e de limitação de expressão cientifica, restrigindo sua produção a determinados interesses de grupos no poder, interesses esses que podem ser vinculados a interesses econômicos, condicionando a produção cientifica às necessidades criadas por um determinado modelo econômico específico, desprezando, através da ideologia oficial, toda produção que contrarie ou não seja útil a esse mode­lo (ideologia aí empregada enquanto distorção da realidade para sua adequação ao modelo autoritariamente imposto por aqueles que se encontram no poder, público ou privado)[1]. Não é que a Universidade não vá formar pessoas que as relações sociais e econômicas necessitam, o que ressalto é a necessidade de autonomia universitária para que se produza o conhecimento para a realidade e para transformar esta realidade. Não podemos ficar “produzindo” meros reprodutores ou técnicos. Temos que criar espaços para produção de alternativas ao sistema e não simplesmente alimentar o sistema.
Esse é o sentido da garantia democrática prevista no art. 207, que deve receber leitura sistemática com o restante do texto e, obviamente, com o capítulo sobre a educação, que estabelece bases democráticas para a gestão do ensino, adequando as instituições de ensino de primeiro, segundo e terceiro graus ao princípio democrático de livre expressão e convivência pacífica de idéias filosóficas, religiosas e políticas, sem nenhum tipo de imposição de qualquer forma de pensar, proibindo-se apenas a divulgação e logo o funcionamento de instituições que preguem qualquer tipo de preconceito ou discriminação.
Logo, a autonomia que será construida, no caso do art. 207 da Constituição, já existente, e das outras defendidas neste trabalho, devem necessariamente respeitar os princípios universais de direitos humanos, construindo sempre modelos de gestão que garantam, dentro do espírito da atual Constituição e da Constituição democráti­ca que estudamos, a plena participação no sistema de autogestão de todos os que constroem o sistema educacional e de saúde.
Para construir o modelo de autonomias democráticas para gerir o sistema de educação e saúde em todas as esferas de poder na federação, partimos da idéia da autonomia universitária, enquanto lugar de autoorganização e autogoverno, limitadas aos princí­pios democráticos e constitucionais, pois autonomia não se confun­de com soberania[2].Um aspecto fundamental da autonomia univer­sitária é a idéia de desvinculação do governo, estabelecendo, as universidades, as políticas de educação superior, tendo a capacidade de proposta orçamentária própria feita diretamente ao Congresso Nacional, no caso de universidades federais, e nas respectivas esfe­ras de Poder Legislativo da federação nos outros casos.
Sobre esse assunto, existe importante estudo do Colégio de Procuradores-Gerais das Instituições Federais de Ensino Superior, órgão da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, que detalha propos­ta inovadora de elaboração de uma lei orgânica das universi­dades, estabelecendo a forma de gestão e organização dessa autonomia constitucional de garantia do regime e da evolução do processo democrático.


[1] Os professores da antiga Alemanha Oriental são desprezados e se encon­tram desempregados após a unificão alemã. Ler: MIRAGLIA, Francis­co. O Leste Europeu e a Construção do socialismo. Universidade e Socie­dade, ano lI, n. 4, p. 91-95, dezembro, 1992. BANDEIRA, Moniz. A reunificação da Alemanha - Do ideal socialista ao socialismo real. São Paulo: Ensaio, 1992.  
[2] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Ato administrativo e direito dos administrados. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981; MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 11. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985; KELSEN, Hans. Teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1938; CAMPOS, German 1. Bidart. Teoria del Estado - Los temas de la ciencia política. Buenos Aires: Editora Comercial, Industrial e Financeira, 1991

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