quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

1019- PODER MUNICIPAL 35 - Conclusões

PARA CITAR: MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Poder Municipal, paradigmas para o estado constitucional brasileiro, Editora Del Rey, Belo Horizonte, 1997, pp.215-218.

Conclusão


No decorrer do trabalho, fizemos análise detalhada de toda a estrutura do Estado e da Constituição, de forma que pudéssemos dispor dos dados teóricos, necessários para propor nova estrutura de um tipo de Estado democrático que rompesse com os modelos tradicionais, os quais decorrem dos Estados constitucionais após o século XVIII, fase de afirmação do Estado liberal, e, em 1917 e 1919, com os parâmetros para os Estados sociais e socialistas.
O mundo contemporâneo assiste uma crise de todos esses modelos, por razões diferentes. O Estado de Bem-Estar Social necessita de crescimento econômico, para que com a arrecadação decorrente dos impostos possa atender à população, concretizan­do direitos sociais. Com a crise econômica deste final de século, aumentou o número de excluídos do sistema econômico, que necessita do amparo do Estado, decorrendo da mesma crise a diminuição da arrecadação do Estado.
Trata-se de contradição insuperável do modelo, pois, quanto mais se necessita do Estado, menor é a sua capacidade de atender à demanda, porque menores são os recursos arrecadados.
Essa questão não foi ignorada pelos teóricos do Estado social do pós-Segunda Guerra, sendo que, diante das crises cíclicas do capitalismo, teríamos no momento de crescimento um Estado poupador, que trabalharia com a ideia de superávit orça­mentário, para nos momentos de crise investir na recuperação econômica e na assistência aos excluídos, trabalhando com a ideia de déficit orçamentário.
Também o Estado socialista, após longa guerra econômica com o modelo neoliberal norte-americano, foi substituído por modelos neoliberais em rios países do Leste Europeu.
Finalmente, a onda neoliberal atual, entendida como a opção por um Estado mínimo, trouxe consequências graves, como um novo processo de concentração econômica e o decorrente desemprego.
Diante desse quadro de final de século, é que propusemos, neste trabalho, enfrentar a questão da construção de novos para­digmas para o Estado constitucional brasileiro, baseado na efeti­va liberdade econômica consagrada pela possibilidade' de opção nas esferas menores de organização estatal por modelos socio­econômicos diversos.
Estudando, inicialmente, a estrutura dos Estados contem­porâneos, caminhamos para a afirmação da ideia de uma repúbli­ca federal municipalista, baseada no poder democrático da cida­dania, exercida pela população da cidade.
Entendemos que a descentralização é o caminho para a afirmação de um Estado efetivamente democrático, por intermé­dio do qual, no espaço municipal, sejam criadas estruturas de permanente participação da população no poder do Estado, direcionando de forma permanente sua atuação.
As ideias desenvolvidas partem de experiências do próprio municipalismo brasileiro e de práticas ocorridas em outros Esta­dos.
Com a defesa da opção por um poder municipal, aplicando­ se o princípio da subsidiariedade para a estrutura do Estado, chega­mos então à análise da organização do poder, concluindo pela necessidade da construção de uma estrutura popular, de participa­ção direta em questões essenciais para o Estado democrático, como a gestão popular da saúde, da educação e do controle por parte da população dos meios de comunicação social.
Ainda, com relação à estrutura do poder estatal, sugerimos a adoção, em nível municipal do sistema diretorial e pelo menos do parlamentarismo em nível estadual e federal. A superação do sistema presidencial é necessária para possibilitar o início da despersonalização do poder, principalmente em nível estadual, uma vez que, com a adoção de uma gestão colegiada e do fortalecimento dos Conselhos poderemos gradativamente, impedir a negativa influência do poder pessoal, principalmente em nível municipal. Para isto, inclusive, pensou-se na participação em um Conselho como o de gestão da saúde, de técnicos concursados, além da criação da figura do Ombudsman munici­pal, com poderes de convocar plebiscitos e referendos e de sub­meter à apreciação da população o poder colegiado executivo e legislativo municipal.
A partir desse ponto, feita uma análise dos novos mecanis­mos democráticos a serem implementados, passamos para o pon­to central da tese, que é a construção de um novo tipo constitcional, onde não haja vinculação com nenhum modelo socioeco­nômico predeterminado, pelo texto federal e estadual, deixando­-se para os Municípios, por meio de seus cidadãos, esta opção nas suas leis orgânicas.
A não-vinculação com modelos socioeconômicos implica a desconstitucionalização da propriedade privada nas Constitui­ções Federal e Estadual, fortalecendo a Constituição municipal, deixando que os cidadãos do município tenham liberdade de construir, a partir de suas experiências concretas e diárias, mode­los alternativos de organização social e econômica.
Não há liberdade efetiva onde a população é obrigada a aceitar modelos de organização social e econômica que não sejam construídos pelas próprias comunidades. A propriedade privada, enquanto direito fundamental, principalmente a proprie­dade privada dos meios de produção, tem representado, muito mais, uma prisão dentro de modelos excludentes, protegendo a Constituição os direitos de poucos. A desconstitucionalização da propriedade na Constituição federal e estadual, deixando a sua regulamentação para a Constituição municipal, significará a li­bertação de amarras, liberando os cidadãos para livremente cons­truir seus modelos, respeitando os limites dos direitos humanos, considerados universais, conforme estudado nesta tese.
Os direitos humanos terão como núcleo constitucional os direitos políticos enquanto processos democráticos que garantam as mudanças que a população livremente escolher, construindo.então um novo conceito de direitos humanos, a partir da ideia da indivisibilidade, para afirmar que estes direitos são constantemen­te mutáveis, tendo como núcleo a vontade política dos cidadãos.
Partindo desses pressupostos, estudamos os principais as­pectos de uma nova Constituição, analisando a conformação de seu texto, que deverá ser sintético, para permitir processos de mutação mais amplos; extremamente rígido, o que implica na clara opção pelos processos legítimos de mudança informal no lugar de mudanças formais; ortodoxo, no sentido de que prevê uma democracia participativa, que permita uma sociedade eclética; e obviamente, escrito, com mecanismos difusos de con­trole de constitucionalidade.
Finalmente, analisando os processos informais e formais de mudança do texto constitucional, concluímos que para a pro­moção das amplas mudanças propostas, que implicam mudança de paradigma constitucional, a legitimação do processo exige uma nova Assembléia Constituinte.
As Constituições Federal e Estadual devem ter um papel processual, não adotando modelos específicos de repartição eco­nômica ou de propriedade. O nosso objetivo é propor uma nova estrutura de Estado e de Constituição que permita haver efetiva­mente liberdade, e que cada cidadão tenha a possibilidade de participar na construção de seu futuro.

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