quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

977- Eleição no EUA: republicanos divididos, cidadãos unidos

Internacional| 10/01/2012 | Copyleft

Eleição nos EUA: republicanos divididos, cidadãos unidos

As primárias do Partido Republicano em Iowa confirmaram alguns fatos fundamentais. Primeiro: os republicanos não estão entusiasmados com nenhum de seus candidatos. Em segundo lugar, ingressamos em uma nova era das campanhas políticas nos EUA após a decisão da Suprema Corte que permitiu um fluxo ilimitado e não declarado de dinheiro das empresas nas campanhas. Cada vez mais gente reage contra essa inundação de dinheiro secreto nas eleições nos EUA. O artigo é de Amy Goodman.

(*) Artigo publicado originalmente no Democracy Now

O resultado das eleições primárias do Partido Republicano em Iowa, que mantiveram o mistério sobre o vencedor até o final, confirmou dois fatos políticos fundamentais e praticamente passou pelo alto de um terceiro. Em primeiro lugar, os republicanos não estão muito entusiasmados com nenhum de seus candidatos. Em segundo lugar, ingressamos em uma nova era das campanhas políticas nos Estados Unidos após a decisão da Suprema Corte que permitiu que um fluxo ilimitado e não declarado de dinheiro das empresas seja investido no processo eleitoral. E, em terceiro lugar, devido ao fato de que o presidente Barack Obama atravessa as eleições primárias sem temer adversários, não se prestou muita atenção ao crescente descontentamento daqueles que o apoiaram para a presidência em 2008. Como consequência disso, o processo da eleição presidencial de 2012 promete ser longo, concorrido, extremamente caro e, talvez, o mais negativo da história.

Mitt Romney tecnicamente venceu as primárias de Iowa por uma margem de apenas oito votos de vantagem sobre o candidato Rick Santorum, que registrou um recente aumento de popularidade. Enquanto isso, o candidato ultra-liberal Ron Paul surpreendeu ao obter 21% dos votos, colocando-se em terceiro lugar numa disputa que envolvia vários candidatos. É preciso levar em conta que o Partido Republicano não permite a realização de recontagem dos votos manuscritos contados manualmente e que a vitória de Romney foi anunciada em primeiríssimo lugar pela cadeia de notícias de direita Fox News por nada mais nada menos que o comentarista Karl Rove, o artífice das controvertidas vitórias presidenciais de George W. Bush.

O ensinamento que pode ser tirado de tudo isso é que, se por um lado, Willard Mitt Romney está com a fachada da “elegibilidade”, por outro, não consegue persuadir a mais de 25% dos republicanos para que votem nele. O aumento do apoio a Santorum foi consequência da combinação dos votos contra Romney e a retirada massiva do apoio a Newt Gingrich, inspirado por uma campanha fulminante de propaganda contra Gingrich, atribuída a Romney.

Apesar de a equipe de Romney em Iowa ter mantido uma estratégia de campanha positiva, um super Comitê de Ação Política (PAC, na sigla em inglês) que o apoiou, adotou uma estratégia ofensica. Segundo Michael Isikoff, da NBC, o comitê Restore Our Future (Restaurar nosso Futuro) gastou 2,8 milhões de dólares em publicidade em Iowa, mais do dobro do dinheiro gasto pela campanha de Romney, para atacar Gingrich. Os comitês de apoio podem receber doações ilimitadas da parte de empresas ou indivíduos e não tem a obrigação de revelar a identidade dos doadores.

Apesar de a lei impedir que os super PAC atuem de modo coordenado com as campanhas, três dos fundadores do comitê Restore Our Future, de Romney, trabalharam em sua fracassada campanha presidencial em 2008. São eles: Carl Forti, Charlie Spies e Larry McCarthy.

A eleição primária de Iowa pode ser interpretada como a primeira instância de uma campanha eleitoral realizado logo depois da decisão sem precedentes da Suprema Corte, em janeiro de 2010, no caso Citizens United contra a Comissão Federal Eleitoral. O blog SCOTUSblog resume a questão da seguinte maneira: a Suprema Corte, em decisão dividida, determinou que “o gasto político é uma forma de proteção da liberdade de expressão em virtude da Primeira Emenda, e o governo não deve impedir que as empresas ou sindicatos gastem dinheiro para apoiar ou denunciar candidatos individuais nas eleições”.

Os períodos eleitorais geralmente são muito benéficos para os canais locais de televisão, que vendem tempo no ar através dos meios de difusão públicos. No entanto, as emissoras de Iowa informaram que os lucros seriam menores do que os esperados devido ao número sem precedentes de debate entre os candidatos, por meios dos quais os candidatos tiveram a oportunidade de apresentar-se ao público basicamente de forma “gratuita”. A avalanche de publicidades negativas nas últimas semanas de campanha provocou um aumento dos lucros dos canais. Dale Woods, gerente geral de um canal de televisão local de Des Moines, disse à revista Broadcasting & Cable: “Geralmente não transmitimos campanhas negativas aqui, mas essa dinâmica mudou com o dinheiro dos Comitês de Ação Política. A compra de espaço publicitário dos candidatos é para publicidades positivas, mas o dinheiro dos comitês é usado em campanhas negativas. Creio que veremos essa dinâmica por todo o país”.

A indústria da publicidade está seguindo de perto os gastos de campanha. A previsão é de que o gasto total das campanhas chegue a 4 bilhões de dólares, incluindo a campanha presidencial e as para o Senado, Câmara de Representantes e governos estaduais.

Mas ainda há esperança. Cada vez mais gente reage contra essa inundação de dinheiro secreto que está infectando as eleições nos Estados Unidos. Os legisladores do Estado da Califórnia estão reclamando uma reforma constitucional para revogar a decisão da Suprema Corte sobre doações de campanha. A prefeitura da cidade de Nova York aprovou uma resolução similar, fazendo eco a medidas aprovadas em Los Angeles, Oakland, Albany e Boulder, Colorado. Na semana passada, a Corte Suprema de Montana reestabeleceu uma proibição criada há mais de 100 anos sobre o gasto empresarial em campanhas e candidatos políticos.

O catedrático de Direito da Universidade de Harvard, Lawrence Lessig, exige que se realize uma convenção constituinte. Segundo a Constituição dos Estados Unidos, 34 legislaturas estaduais teriam que convocar a convenção, que poderia aprovar uma reforma para proibir que as empresas financiem campanhas eleitorais. Lessig, muito popular entre os progressistas, pediu o apoio do movimento conservador de direita Tea Party. Ele me disse:

“Do ponto de vista político, o aspecto interessante de tudo isso é que as pessoas podem convocar uma convenção por qualquer motivo. Já há um forte movimento conservador que pressionará para que haja uma convenção que tenha como objetivos a busca de um orçamento equilibrado ou a fixação de um limite para a dívida nacional. Creio que todas essas propostas devem ser consideradas no marco de uma convenção. No entanto, creio que, lamentavelmente, a única opção que tempos para intervir e modificar este sistema corrupto é aquela que nos deram os pais fundadores do país, ou seja, aqueles que não fazem parte da classe política devem se organizar para resolver o problema que há hoje em Washington”.

(*) Amy Goodman é apresentadora de Democracy Now! um noticiário internacional diário, nos EUA, de uma hora de duração que emite para mais de 550 emissoras de rádio e televisão em inglês e em 200 emissoras em Espanhol. Em 2008 foi distinguida com o "Right Livelihood Award" também conhecido como o "Premio Nobel Alternativo", outorgado no Parlamento Sueco em Dezembro.

(*) Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desse artigo.


Tradução: Katarina Peixoto

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