sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

988- PODER MUNICIPAL 21 - bicameralismo e unicameralismo


 PARA CITAR: MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Poder Municipal, paradigmas para o estado constitucioal brasileiro, Editora Del Rey, Belo Horizonte, 1997, pp. 156-158.

14 BICAMERALISMO E UNICAMERALISMO

A adoção de uma organização do parlamento em uma ou duas Casas legislativas ultrapassa a discussão da forma federal de Estado, podendo adotar aspectos políticos relevantes da esta­bilidade e conservação do ordenamento jurídico[1].
No Brasil, a Constituição de 1988 mantém o bicameralis­mo, estabelecendo uma Câmara de Deputados de representantes do povo e o Senado como representação dos Estados-Membros. O Senado cumpre também a função de Casa Legislativa revisora e moderadora, com o objetivo de barrar prováveis mudanças bruscas que venham ocorrer, através de uma alteração radical na composição da Câmara dos Deputados, que tem renovação de todos os seus membros de quatro em quatro anos.
A Câmara dos Deputados, pelo fato de representar os cidadãos, e uma vez que se adotou o sistema de circunscrições por Estados-Membros, deve ter número variável de Deputados, por Estado-Membro, correspondente à proporção do número de seus eleitores.
Entretanto, como já foi dito anteriormente, os números, mínimo oito e máximo setenta, de Deputados por Estado, não permitem que haja a proporcionalidade exigida por princípio da própria Constituição, visto a enorme disparidade existente entre os Estados mais e menos populosos.
O Senado Federal, por representar a federação, estabelece pesos iguais de representação entre os Estados, sendo que cada um terá três representantes, incluindo-se, a partir de 1988, a representação do Distrito Federal.
O aspecto conservador do Senado Federal será muito mais marcante do que sua natureza de Casa Legislativa, que tem a responsabilidade de manter o equilíbrio federal.
Esse posicionamento manifesta-se, claramente, em três momentos: o mandato de seus membros; a forma de renovação dos mesmos; a sua competência legislativa.
O mandato dos Senadores é de oito anos, o dobro do mandato dos Deputados Federais, não existindo,ainda,possibilidade de renovação de todos os seus membros de uma só vez,pois a eleição ocorre a cada quatro anos, renovando-se um terço e dois terços dos seus membros alternadamente.
O estabelecimento desse mecanismo implica a existência de Casa Legislativa, que poderá representar em determinado momento político, barreira às transformações mais radicais, oriundas de uma Câmara dos Deputados totalmente renovada.
O caráter limitador do processo legislativo pelo Senado se agrava pela elaboração normativa estabelecida na Constituição, em que todas as matérias devem ser votadas, normalmente, nas duas Casas Legislativas separadamente, e em alguns casos, como na apreciação de veto presidencial, pelo Congresso Nacional, em sessão unicameral.
A adoção desse processo implica que as matérias oriundas da Câmara dos Deputados deverão ser discutidas e votadas no Senado, sendo que, se não aprovadas, serão arquivadas, podendo ainda sofrer emendas, que desvirtuarão seu conteúdo inicial.
Estas constatações no texto constitucional levam-nos a concluir que o unicameralismo oferece uma dinâmica muito mais adequada a um país em transformação. Entretanto, a adoção do unicameralismo poderá significar em uma federação, especial­mente no Estado Federal brasileiro, com disparidades populacionais, sociais e econômicas tão graves, prejuízos sérios aos Estados menos populosos e em geral mais pobres.
A superação do problema pode ocorrer de maneira sim­ples, partindo-se da modificação dos três fatores, enumerados anteriormente, como responsáveis pelo caráter conservador do Senado.
A redução do mandato para quatro anos e a renovação de todos os seus membros, simultaneamente com a Câmara de De­putados, pode eliminar este caráter conservador, mantendo-se o equilíbrio federal no parlamento.
Outro avanço pode ser alcançando, corrigindo-se o proces­so legislativo e estabelecendo-se competências diversas para as duas Casas Legislativas. Determinando-se para o Senado compe­tências legislativas específicas, que envolvam diretamente inte­resses dos entes federados, como a matéria tributária, por exemplo, pode-se eliminar bastante o seu caráter conservador, mesmo mantendo-se a atual fórmula de renovação dos membros do Senado e a duração dos mandatos.
Toda essa discussão deve ser aprofundada, para permitir a construção de um modelo ágil de estrutura estatal que esteja pronto para responder, com rapidez, aos comandos da população.
Resta uma discussão: levantamos, anteriormente, as op­ções existentes para a desejável descentralização de poder, colo­cando as fórmulas de uma federação de Municípios; uma miniaturização dos Estados-Membros; ou a simples modificação da repartição de competências e os mecanismos atualmente exis­tentes ainda muito centralizados.
Ao concluirmos, naquele momento, que a última opção acima citada seria a de possível implementação, diante de nossa realidade política, social e econômica, eliminamos o problema da representação dos vários entes federados, que seriam criados ao se adotar as duas primeiras fórmulas.
Entretanto, a superação dos problemas criados, com as duas primeiras opções, com a representação dos nossos entes federados em um Senado, pode ser superado com fórmulas de representação regional e de Municípios; e no estabelecimento de salvaguardas constitucionais dos entes federados.
Embora a Constituição Federal tenha criado nova federa­ção, integrada expressamente pelos Municípios, não houve preo­cupação com o estabelecimento de uma representação municipal no Senado, visto que os interesses dos Municípios podem ser mais facilmente equacionados no âmbito dos Estados-Membros. A não-representação dos Municípios no Senado Federal não pode ser justificativa de não-aceitação destes como entes federados, primeiro por ser determinação expressa da Constitui­ção e, em segundo lugar, por estarem eles, amplamente, resguar­dados nos seus interesses perante a União, através dos Senadores representantes dos Estados que os Municípios integram. Existem mecanismos de organização municipal, no âmbito dos Estados, desde que suas competências e recursos estejam constitucionalmente assegurados, o que ocorre no atual texto, mesmo que de forma tímida e ainda excessivamente centralizada.


[1] LIJPHART, Arend. As democracias contemporâneas. Portugal: Gradiva, 1989, p. 129-147.

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