sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

989- PODER MUNICIPAL 22 - A Constituição democrática


PARA CITAR: MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Poder Municipal, paradigmas para o estado constitucional brasileiro, Editora Del Rey, Belo Horizonte, 1997, pp.159-162.


Capítulo III

A CONSTITUIÇÃO DEMOCRÁTICA



Uma vez estudada a estrutura do Estado democrático, suas opções de organização e exercício do poder, e realizada a discus­são das alternativas para oferecer numerosos e melhores canais de comunicação entre cidadãos e Estado, passamos a estudar a Constituição democrática, que, além de contar toda a estrutura organizacional do Estado, trará princípios e regras que condicio­narão sua atividade.
O estudo até aqui realizado visou estabelecer todos os pressupostos organizacionais do Estado e sua relação com a sociedade civil, para chegarmos ao ponto central do trabalho, que é a da construção de nova Constituição democrática, baseada em nova leitura dos direitos humanos, já vista anteriormente, que passam a ter como ponto de convergência a idéia de democracia dialógica, radical, com mecanismos majoritários e consensuais, baseada em princípios universalmente aceitos.
Parte-se da ideia de que não seria o Estado, nem um grupo que detém o poder de representação, quem dirá qual o modelo social, econômico e político que deve ser adotado, mas sim, todas as pessoas, de forma dialógica e consensual, devem fazer isto, dentro de uma estrutura de poder local descentralizada e exercida por todos.
Para conseguir esse objetivo, pensamos em uma Constitui­ção de princípios, em que as regras, em sentido restrito, se limitassem basicamente às normas necessárias para organização do Estado; distribuição de competência; a relação entre os pode­res; garantias de direitos humanos universais e seus respectivos remédios processuais; e a não-definição de um modelo socioeco­nômico, que seria construído pelos cidadãos, em esferas de poder descentralizado e democraticamente organizadas.
Nesse sentido, a consequência desse novo modelo seria a adoção de nova Constituição Democrática, uma vez que todas as Constituições, a partir do marco histórico fundamental de afirmação do Estado Liberal, com as revoluções burguesas do século XVIII, trazem um modelo específico de organização social, polí­tica e econômica.
Como vimos anteriormente, se classificarmos as Consti­tuições, a partir desse momento histórico até os nossos dias, em Constituições liberais, sociais e socialistas, constatamos que to­das adotarão um modelo econômico e social específico que as identificará.
Ao propormos uma Constituição democrática, que legiti­me pelo processo de participação e cidadania, as mudanças soci­ais, econômicas e políticas que os cidadãos livremente decidi­rem, rompemos com todo um ciclo de Constituições, que de formas diferentes conduzem obrigatoriamente o povo a adotar e seguir modelos preconcebidos, sejam liberais, socialistas ou os mais diversos modelos neoliberais no século XX (incluindo a social democracia).
Como consequência desta proposta, chegamos então à necessidade de desconstitucionalização, de todo e qualquer dis­positivo que estabeleça modelos socioeconômicos. Entretanto, ao falarmos em desconstitucionalização da ordem econômica e social, frisamos que esta não poderá significar a simples retirada do modelo de intervenção do Estado no domínio econômico, para regulamentar ou mesmo exercer atividade econômica, pois significaria retrocesso intolerável e injustificável ao modelo que historicamente não funcionou: o liberalismo. Dessa for­ma, a desconstitucionalização do modelo socioeconômico deve significar não apenas a retirada dos modelos neoliberais de inter­venção em diversas graduações, mas também a desconstituciona­lização da propriedade privada dos meios de produção, que deixa de ser direito fundamental para ser regulamentada em nível infra­constitucional.
Durante a análise da estrutura do Estado democrático, con­cluímos que o modelo mais adequado para permitir mais participa­ção dos cidadãos, influindo diretamente no poder estatal, seria a descentralização, aumentando os poderes dos Municípios.
Dessa forma, ao se adotar um modelo federal descentralizado, em nível municipal, poderíamos sugerir que a desconstitucionali­zação do modelo socioeconômico deveria ocorrer em nível fede­ral e estadual, para permitir que o poder municipal local, respei­tados os limites impostos pelos princípios, valores e direitos fundamentais consagrados pela Constituição Federal e Estadual, vontade dos seus cidadãos.
Outras questões fundamentais devem ser analisadas para chegarmos às conclusões finais deste trabalho.
A primeira delas constitui em saber se a interpretação constitucional poderá construir este modelo sem necessidade de grandes mudanças no atual texto; em segundo lugar, qual a amplitude dessas mudanças e a possibilidade de realizá-las sem que seja necessário o rompimento com a Constituição e o estabe­lecimento de nova Assembléia Constituinte.
Sabemos que o processo de mutação constitucional pode romper com o modelo constitucional, para a construção de um novo, por intermédio da interpretação constitucional, inserindo-se o texto escrito, suas regras e princípios em realidades históri­cas diversas. A Constituição norte-americana de 1787, até hoje vigente, é um bom exemplo. Resta saber se um texto analítico, extremamente detalhado como o nosso, pode servir a este proces­so de evolução interpretativa, a que queremos chegar.
Dessa forma, passamos à análise de alguns aspectos da Constituição, para que ao final do trabalho possamos responder essas indagações.

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