segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Teoria do Estado 36

5.1 Um Novo Município – Federação de Municípios ou Miniaturização dos Estados Membros – Como viabilizar a democracia participativa no Brasil
José Luiz Quadros de Magalhães


No livro O Poder Municipal, tivemos a oportunidade de abordar esse tema de forma aprofundada, defendendo uma nova Constituição aberta, que permita mudanças permanentes, desde que democráticas. A Constituição democrática não se vincula necessariamente à municipalização do poder ou a uma Federação de municípios. A idéia central defendida é a de uma Constituição na qual estejam assegurados os princípios e os processos de uma democracia plena, baseada nos princípios universais de direitos humanos e princípios democráticos, como a mutabilidade das decisões e o reconhecimento de uma minoria pode tornar-se maioria, onde o Estado esteja apto a assegurar as transformações que sejam apontadas de maneira democrática pela população, respeitados os referidos princípios.
Outra idéia fundamental que, acredita-se, permitirá a permanência da Constituição e da democracia em processos constantes de mudanças desejáveis e permitidos, desde que respeitados os processos e os princípios constitucionais, será a desconstitucionalização da ordem econômica e, logo, como conseqüência, a necessária desconstitucionalização da propriedade privada, pois a desconstitucionalização da intervenção do Estado na ordem econômica com a permanência da propriedade privada significa mero retorno às Constituições Liberais.
Essas reflexões, desenvolvidas em vários outros trabalhos, levam a duas conclusões, que seriam indicativas de melhoria e aprofundamento do processo democrático: a primeira, a necessidade de repensar os direitos humanos na sua perspectiva constitucional, inicialmente, chegando-se à conclusão inevitável de que não há efetiva democracia sem educação e liberdade; e a segunda, a necessidade de descentralizar o quanto mais o poder, conferindo aos municípios mais competências e uma nova organização, com um sistema diretorial, a criação de um ombudsman e a criação de autarquias especiais desvinculadas do Executivo municipal para gerir saúde e educação.
Com essas indicações, encontramo-nos no desafio de pensar uma nova Federação e o grave problema da criação e extinção de municípios, com vários processos de desmembramentos em todo o País.
A Constituição atual estabelece um sistema de criação e extinção de municípios e de Estados membros que tem possibilitado um explosão de novos municípios em todo o País, muitos deles sem capacidade econômica de sobrevivência.
O modelo atual estabelece, no art. 18 da Constituição, que os Estados poderão ser desmembrados, incorporados entre si ou subdivididos, enquanto os municípios poderão ser desmembrados, incorporados ou fundidos, o que é o mesmo que incorporação entre si.
Entende-se por desmembramento o processo de separação da parte do território de um Estado ou município para a formação de outro. Neste processo, é importante notar que o Estado ou município que perde parte de seu território para a criação do novo ente permanece com a mesma estrutura política e organizacional. Desta forma, foram criados os Estados de Mato Grosso do Sul e Tocantins a partir do Mato Grosso e Goiás, bem como são criados incontáveis municípios em todo o país, todos os meses.
A fusão ou “incorporação entre si” é outro mecanismo previsto constitucionalmente, tanto para Municípios como para os Estados.
A fusão consiste na união de dois Estados ou municípios que desaparecem para dar origem a um novo Estado ou município no novo território ampliado, desaparecendo os entes políticos anteriormente existentes com toda a sua estrutura organizacional.
A fusão de Estados e municípios não é um mecanismo utilizado, pois reflete a distorção dos mecanismos da criação de Estados e municípios, utilizados para satisfazer interesses de grupos do Poder local e vaidades pessoais, o que não é o objetivo do texto da Constituição. Por esse motivo, existem inúmeros desmembramentos de Municípios e quase nenhum processo de fusão.
A subdivisão é um processo de criação apenas de Estados membros e não de municípios. A subdivisão implica o desaparecimento do ente federado original para a criação de dois ou mais novos entes, com nova estrutura organizacional.
De outra forma, a incorporação de um Estado a outro só pode ocorrer na esfera municipal. Esta consiste na absorção de um município por outro, desaparecendo o município incorporado, que cede seu território ao município incorporador, que permanece com sua estrutura organizacional de acordo com a Constituição municipal.
Este modelo também não é utilizado, pois a tendência tem sido a miniaturização de municípios que coexistem com grandes centros urbanos, as metrópoles cuja péssima qualidade de vida pede uma imediata desconcentração que só ocorrerá com políticas econômicos que permitem a dispersão do investimento e o desenvolvimento equilibrado de todo o território. Isto só pode ocorrer com planejamento econômico estatal, pois o planejamento econômico privado não trabalha com esse tipo de lógica, pois é movido unicamente com o lucro egoísta que permite a sua sobrevivência.
Mais uma vez, a ausência do interesse público e do planejamento na atuação do Estado no domínio econômico tem proporcionado o crescimento econômico desordenado e desequilibrado.
Não se pode afirmar, em nenhum momento, que a lógica pública tenha levado a esse modelo, pois ela nunca existiu. O que tem sido prática comum no Estado brasileiro é a utilização privada do Estado e dos recursos públicos, que conduzem de forma errada o direcionamento do desenvolvimento econômico.
Exemplo recente dessa lógica pública destorcida e da total falta de planejamento macrorregional é a guerra do ICMS, que, no ano de 1995, consistiu na concorrência livre entre os Estados da Federação que ofereciam vantagens tributárias com alíquotas mais baixas de ICMS para atrair investimentos nos seus respectivos Estados.
Numa Federação, onde a centralização tem sido regra, no momento em que a União deveria atuar em competência de sua exclusiva responsabilidade, como a de estabelecer políticas econômicas e sociais que permitam um desenvolvimento equilibrado de todo o território de Federação, esta é omissa.
Não há planejamento de desenvolvimento nacional, regional ou municipal, princípio básico para o desenvolvimento de qualquer tipo de política econômica, seja privada ou pública. O Estado não tem planejado, mas improvisado.
Na proposta de municipalização do poder, a Federação brasileira pode ter novos caminhos e estes devem ser construídos na experiência diária, que permite, por intermédio de modificações na estrutura constitucional, os estabelecimento efetivo de um poder municipal assentado sobre novas bases, que resgatem efetivamente a integridade territorial do município, não baseada no poder egoísta e privado de líderes locais personalistas ignorantes, autoritários e antiquados, mas no exercício de uma cidadania na base do poder territorial, esta construída sobre uma identidade econômica, cultural e hoje histórica e de identidade de perspectiva de construção de um futuro comum. Logo, o atual modelo de repartição territorial tem de ser reforçado e, a partir de então, reestruturado, assim como dificultada qualquer tentativa de modificação territorial da base socioeconômica e cultural do município.
Nessa perspectiva, surge um questionamento. Uma Federação de municípios ou a Miniaturização dos Estados membros? Mesmo a Constituição brasileira determinando expressamente que a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios deverá preservar a continuidade e a unidade histórico-cultural do ambiente urbano, impondo ainda a necessidade de lei complementar estadual e a necessária consulta prévia através de plebiscito, quando se ouvirá as populações diretamente interessadas, os micromunicípios proliferam-se com incrível velocidade em todo o País.
A observância da continuidade histórico-cultural do ambiente urbano tornou-se exigência meramente formal, que em nada obstaculiza essa proliferação desnecessária, que serve apenas a interesse pessoais de lideres locais e deputados à caça de votos.
O modelo de valorização do poder em um espaço territorial menor está vinculado à idéia de espaço econômico, cultural e político que fundamente a unidade municipal e sua viabilidade econômica, e deve ser o fator primeiro a ser observado na recomposição dos municípios brasileiros, possibilitando a construção de uma nova Federação, onde os municípios cumpram o papel mais importante de construção de uma democracia e de uma cidadania plena.
A permanência do atual modelo de criação de municípios e de sua modificação territorial inviabiliza qualquer projeto de organização político-constitucional que permita o aumento do poder desses municípios.
Voltando ao questionamento que se colocou neste tópico, podemos apontar, na verdade, não dois, mas três modelos de Federação novos.
No modelo de uma Federação conforme prevista no art. 18 da Constituição, é possível a sua construção com a alteração de vários dispositivos constitucionais vigentes, especialmente os referentes à distribuição de competências, contidos no Título III e o seu Capítulo IV, pois ali está definido o sistema de governo do município que entendemos dever ser diretorial.
Dependendo, portanto, do grau de modificação que se pretende implementar na atual estrutura federal, o número de artigos a serem modificados poderá ser maior ou não. Note-se, entretanto, que a modificação da estrutura federal é necessária e admitida pelo texto constitucional, que permite emendas que aperfeiçoem a forma federal.
O art. 60, § 4, estabelece limitações materiais ao poder de emenda e, conseqüentemente, ao poder de revisão, se entendermos que outra revisão poderá ocorrer, o que, entretanto, não nos parece possível com o dispositivo que a previa no ADCT tendo cumprido seus efeitos e, portanto, desaparecido.
O inciso I, do § 4º do art. 60, estabelece que não poderão ser objeto de deliberação emendas tendentes a abolir a forma federativa de Estado. A idéia de Federação, como já mencionada neste trabalho, implica a descentralização, logo, a proibição estabelecida no inciso I só se pode referir a emendas que tendem a abolir a Federação, concentrando o poder no lugar de descentralizar. Não há, portanto, vedação de emendas que procurem aperfeiçoar ou aprofundar a forma federativa brasileira, não sendo vedada a supressão do Texto constitucional de definições dos sistemas de governo ou mesmo de sua alteração para um sistema que, embora não coincidente com o sistema da União ou mesmo dos Estados, permita o melhor funcionamento da democracia na menor esfera estatal, onde o poder deve ser mais forte e democrático.
O outro caminho que apontamos no questionamento feito necessita de uma alteração muito profunda do Texto constitucional e, conseqüentemente, de toda estrutura organizacional em âmbitos estadual e municipal em todo o Brasil, uma verdadeira revolução nas bases do poder local. Uma Federação de municípios implica o desaparecimento dos Estados membros como entes federados, que passariam a ser apenas regiões administrativas com funções de coordenação de políticas de investimentos e infra-estrutura, para permitir a organização socioeconômica da Federação e o desenvolvimento de políticas macroeconômicas e de desenvolvimento regional, e de re¬giões metropolitanas. Problema de difícil solução seria o da representação dos municípios na Federação, diante da extensão do nosso país e o grande número de municípios existentes, mesmo que a atual divisão destes fossem repensada. A representação unitária seria impossível e talvez tivesse de ser feita por intermédio de seus representantes, escolhidos em regiões de desenvolvimento criadas a partir de interesses econômicos, políticos comuns e identidade cultural.
Por implicar toda estrutura municipal existente, o que teoricamente pode parecer necessário e urgente, esta idéia pode estar na verdade muito distante da sua real possibilidade de implementação, o que nos faz retornar à idéia de simples modificação nas competências, conforme estão divididas na Constituição, reforçando muito o poder municipal e transformando o seu sistema de governo ou talvez simplesmente deixando que o município mesmo decida, em sua Constituição, qual o que melhor se adapta à sua cultura e história.
Como se vê, não colocamos aqui a defesa do poder municipal como uma reação à Federação, mais sim como a própria essência do federalismo já adotado pela Constituição de 1988, que inclui os municípios como entes federados.
O terceiro caminho que apontamos é o que chamamos de miniaturização dos Estados membros, ente federal que irá concentrar todo o poder efetivo de decisão de modelos socioeconômicos no seu espaço territorial. É importante lembrar que nos referimos a modelos socioeconômicos como modelos de repartição econômica e de propriedade, portanto, políticas socioeconômicas municipais, não ignorando o papel fundamental, que só poderá ser exercido pela União, de coordenação e destinação das políticas estatais macroeconômicas de investimento público e privado. Queremos dizer com isso que, por exemplo, a instalação de uma fábrica de automóveis em uma região não será decidida por uma ridícula guerra fiscal de municípios ou de Estados membros, mas será fruto de uma política macro de desenvolvimento equilibrado do território nacional.
A miniaturização dos Estados membros não implicaria mexer com toda a estrutura organizacional dos municípios, mas sim o estabelecimento de uma grande política e desmembramento de Estados membros, conferindo a estes novos Estados um limite territorial muito menor, que seria definido a partir de pressupostos econômicos, culturais, políticos e sociais.
A grande dimensão dos Estados brasileiros se deve à dimensão do País, que é maior do que os Estados Unidos da América, se não contarmos o território do Estado do Alaska, que os americanos adquriram dos russos, lembrando que a divisão federal norte-americana conta com 50 estados, quase o dobro do Brasil.
Outros países que adotam o sistema federal têm Estados com dimensões muito menores, como a Alemanha, ou ainda a Suíça, onde a federação conta com os Estados, ou Cantões, que adotam o sistema de governo diretorial e têm dimensão territorial muito menor.
Ao criarmos qualquer teoria sobre o Estado, temos, para não cometer os repetidos erros do passado, de trabalhar sobre a realidade do país, sob pena de transformar um trabalho como este, que se pretende ousado, em livro não muito interessante de ficção jurídica. Logo, não queremos comparar o que não pode ser comparado, por diversos motivos: dimensão territorial, história, cultura, tradição, etc.
Ao mesmo tempo, não queremos resignar-nos a um nada fazer, ou a um conformismo de uma eterna repetição do óbvio, que, mesmo assim, não é cumprido. Ao acreditarmos que a solução dos incontáveis problemas do Estado contemporâneo e do ser humano, neste final do século, não está na mudança do sistema econômico ou no estabelecimento de modelos sociais e econômicos milagrosos capazes de resolver todos os problemas, mesmo à custa de milhões de vidas, mas sim na mudança do ser humano, por intermédio da comunicação, do diálogo permanente entre diferentes pensamentos e diferentes culturas, fruto da relatividade dos nossos tempos, temos de pensar um modelo organizacional da sociedade que permita essa comunicação permanente.
O modelo constitucional de organização do Estado e da sociedade deve permitir que o processo democrático, legitimador das mudanças permanentes, efetive-se de forma eficaz, e este é o objetivo das reflexões aqui desenvolvidas. Por esse motivo, corremos o risco de tentar construir uma reflexão que permita o início deste processo de reorganização estatal, que permita o exercício de uma democracia participativa de constante mutação. Até hoje, a estrutura estatal tem existido para conservar, reagir, ou, no máximo, manter mudanças controladas de acordo com determinada fórmula socioeconômica, num exercício de poder mistificado pertencente ao grupo no poder. Se quisermos construir uma democracia efetiva, este modelo organizacional do Estado deve ser mudado.
Dos caminhos que aqui discutimos, talvez o mais realista para o Brasil seja o primeiro. Lembramos, entretanto, que não temos a pretensão de estabelecer uma fórmula que apresente respostas para a infinita variação de problemas que podem aparecer com a sua implementação. Esse modelo é apenas um ponto de partida para reflexão, e a pretensão do cientista, hoje, não poder ir além disto, num mundo em que nos certificamos, diariamente, de suas infinitas possibilidades.
São várias as formas de organização do município em todo o mundo, estudo que, pela sua extensão e complexidade, estar por merecer um tratado que supere as obras existentes, que analisam apenas certos aspectos de forma estanque, o que não nos oferece um real panorama da realidade. O município, no Brasil, organizou-se a partir da experiência portuguesa, que simplesmente foi transportada para o Brasil-Colônia.
Com a fraca presença do Estado português no vasto território da colônia, o poder local privado tomou a estrutura do Estado no município, trazendo, desde então, a grave confusão entre espaço público e espaço privado, interesses públicos e interesses privados, grave distorção que reflete de maneira forte até os nossos dias, onde o grande desafio é desprivatizar o Estado, criando efetivamente um espaço público e, muito importante, uma consciência da coisa pública.26
As idéias aqui desenvolvidas não surgem do nada, não são meras divagações teóricas, mas pretendem ser matérias de discussão que permita a procura de modelos que possibilitem a construção de espaços de comunicação para o desenvolvimento do processo democrático, e isto só poderá ocorrer no espaço menor de poder local, onde a democracia possa ser exercida de forma direta e participativa.
É necessário aproximar as teorias de organização do Estado de nossa realidade diária no município e, neste sentido, entendemos que uma Constituição, que mais do que ditar regras em sentido restrito, consagre princípios e assegure processos legitimadores das transformações socioeconômicas por intermédio do poder local, será um instrumento útil para o aprofundamento do Estado democrático. Por isso, não apontamos apenas mais um modelo no meio de muitos, mas procuramos estabelecer discussões pontuais sobre a organização do Estado e da Constituição, no sentido de chegarmos a um caminho amplo de participação garantido constitucionalmente, onde os detalhes de seu funcionamento serão estabelecidos segundo critérios decididos no próprio Município de forma democrática, segundo as tradições e a cultura local, respeitados os princípios fundamentais universais de Direitos Humanos.
A Constituição brasileira estabelece um novo modelo de federalismo onde estão incluídos, como entes federados, além da União e dos Estados membros, os municípios e o Distrito Federal.
Este dispositivo, por muitos criticado, estabelece, como já estudado, uma Federação com três círculos de poder, sendo que, na esfera menor de poder, existe uma Federação de municípios que forma a União ao lado dos Estados. Sem dúvida, a fórmula constitu¬cional é inovadora, mas em nada refletiu na realidade nacional, sendo que não são poucos os autores que negam os municípios como entes federados e muito menos uma hipótese de uma esfera de uma federação de municípios.
Talvez o papel mais importante desse modelo tenha sido o de levar a discussão constitucional até os municípios, que tiveram de elaborar suas Constituições ou, na denominação da Constituição Federal, Leis Orgânicas Municipais.
Seguindo-se a avalanche de ações diretas de inconstitucionalidade movidas pelos prefeitos, que tiveram seu poder extremamente reduzido, de forma inconstitucional, pelo Legislativo municipal com poderes constituintes, as Assembléias Constituintes municipais limitaram-se a repetir as Constituições Federal e Estadual, e esta última, por sua vez, limitou-se a repetir a Constituição Federal.
Além da importante valorização da Constituição Federal, o novo modelo constitucional de Federação é negado pela mesma, resultando muito mais próximo de um Estado Unitário do que propriamente de uma Federação.
Os constituintes, ao detalharem a organização dos Estados e municípios e limitarem extremamente a competência destes diante da União, destroem a forma de Estado que procuraram estabelecer e, inclusive, proteger, transformando-a até mesmo em clausula pétrea.
Exemplo ao apego ao centralismo está em dispositivos constitucionais como o art. 22, que estabelece competências legislativas privativas da União, admitindo, no parágrafo único, a hipótese de delegação dessas competências aos Estados membros somente por intermédio de lei complementar, sobre questões específicas e nos limites estabelecidos por esta lei. Note-se que muito das competências elencadas como privativas da União deveriam, em uma Federação, ser competências dos Estados.
A forma de Estado é protegida no art. 60, § 4º, inciso I. Entretanto, a limitação material do Poder Constituinte derivado, de reforma da Constituição, seja por intermédio de emenda ou revisão, proíbe a deliberação de emendas tendentes a abolir a forma federativa.
O aperfeiçoamento da Federação não é, pois, impedido, podendo-se, através de emendas, alterar o sistema de governo do município, enxugando a Constituição dos seus excessos e aumentando o poder municipal.
Passamos, então, à análise da nova organização municipal que permita canais mais democráticos de participação e incentive esta participação.
A partir do exposto inicialmente, podemos perceber que, por intermédio de uma reforma da Constituição, podemos aperfeiçoar o federalismo, aumentando o grau de descentralização e, com isto, aumentando o poder dos municípios e Estados, deixando para estas esferas de poder a decisão sobre o seu sistema de governo.
Entendemos que o sistema de governo mais adequado e mais democrático é o sistema diretorial, que tem como uma de suas qualidades maiores um Poder Executivo não personalista, colegiado e submisso à vontade do Legislativo, uma vez que se encontra dentro do Poder Legislativo, ou seja, é um órgão deste.
Não há contradição no fato de existirem, nas diferentes esferas de poder, sistemas de governos diferentes, podendo o Estado adotar um sistema diferente da União e, por sua vez, os municípios adotarem um sistema diferente do Estado e da União. Não haveria também problema na adoção de diferentes sistemas de governos no âmbito municipal da Federação brasileira.
Ideal seria, entretanto, encontrar parâmetros comuns para a definição do sistema de governo diretorial nos municípios, podendo existir, entretanto, variações na organização desse sistema de município para município, o que é absolutamente saudável e recomendável.
Em linhas gerais, o diretório municipal teria como características a existência de um órgão colegiado representativo da sociedade local, formado por técnicos e pessoas de ilibada reputação, que necessariamente não precisam pertencer a partido político, escolhido diretamente pelo parlamento.
O diretório, uma vez escolhido, não poderá ser destituído pelo Legislativo, assim como não poderá dissolver este. A única hipótese de destituição do diretório será através de pedido fundamentado do ombudsman municipal, que, representando interesses dos eleitores, poderá convocar plebiscito para resolver sobre a destituição do Executivo e a dissolução do Legislativo.
Durante o normal funcionamento dos poderes, no caso de divergência entre Executivo e Legislativo, prevalecerá a vontade do último, sendo que, em situações especiais, poderá o ombudsman municipal, do qual tratamos em um artigo, determinar a submissão da questão à apreciação popular por meio de referendo e plebiscito dentro dos limites legais.
O plebiscito e o referendo, também já estudados neste livro, são mecanismos de democracia semidireta, nos quais a população opina diretamente sobre determinada questão, vinculando a vontade dos representantes. Esses mecanismos de participação popular podem se diferenciar na doutrina e, no direito brasileiro, na vigência da Constituição de 1988, pelo momento em que ocorrem e pela complexidade de um e de outro mecanismo. Importante, entretanto, ressaltar que não há, nos textos constitucionais como na doutrina, uniformidade na utilização dessas expressões.
No ordenamento constitucional vigente, o plebiscito tem o sentido de se submeter à apreciação direta da vontade popular determinada questão simples, não se chegando ao detalhamento de sua normatização, uma vez que o plebiscito precede uma decisão importante ou a elaboração de uma lei ou a reforma da Constituição.

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