segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Teoria do Estado 29

7 CONCEITO DE PARTIDOS POLÍTICOS
Jose Luiz Quadros de Magalhaes

Segundo Linares de Quintana, provavelmente os partidos, em sua acepção ampla, já existissem desde as sociedades primitivas, uma vez que, quatro séculos antes de Cristo, Aristóteles já afirmava ser o homem um animal político e doméstico por natureza. Sem dúvida, os povos primitivos, em uma etapa primária de desenvolvimento político, mostram evidências de discordância de opinião e a conseqüente formação de facções. Obviamente, nestas comunidades primitivas não poderiam existir verdadeiros partidos políticos, pois estes supõem a existência de um clima de liberdade e respeito; era, sim, somente facções que canalizaram o instinto de luta e ação.
Os partidos políticos, nas sociedades modernas, explicam-se não só como anomalia ou enfermidade dos povos, mas sim, precisamente, pela natural diversidade de idéias, sentimentos e interesses que dividem os homens em grande parte das sociedades contemporâneas.
Parte Linares de Quintana do pressuposto de pluripartidarismo para a observação acima citada.
Citando outra passagem interessante da mesma obra do jurista argentino, podemos encontrar outra noção que merece ser refletida:

“Es que hablar de partidos políticos importantes referiras simultaneamente a la lucha partidaria, y que la primera característica sociológica de los partidos políticos, resulta de su ubicaión dentro del cuadro de los processos sociales, del que formam parte como um medio a manifestación de conflito y rivalidad, cuejo contenido es de natureleza política. El partido existe para la lucha, siendo su fin último la organización de al voluntad estatal, po decisión de la voluntad popular.”14

Giovanni Sartori, em importante trabalho sobre os Partidos e Sistemas Partidários, assevera que a definição de Burke, muito citada, embora pouco compreendida, é a de que o partido significa um

“grupo de homens unidos para a promoção, pelo seu esforço conjunto, do interesse nacional com base em algum princípio com o qual todos concordam. Os fins exigem meios, e os partidos são o ‘meio adequado’ que permite a esses homens ‘levar seus planos comuns à prática, com todo poder e autoridade do Estado’. Evidentemente, o partido de Burke não é apenas um meio respeitável, é um partido com todas as diferenças que um partido tem de uma parte, isto é, uma agência concreta, algo tão real como as facções. Ao mesmo tempo, facções e partidos já não podem ser confundidos: tornaram-se diferentes por definição. Segundo palavras de Burke, ‘essa generosa luta pela perda (do partido) [...] será facilmente distinta da luta mesquinha e interessada por cargos e emolumentos – sendo esta última uma excelente definição dos propósitos das facções’. O argumento já não é de que o partido termina sem¬pre na facção, mas o de que, nesse caso, o partido não é um partido.”15

É uma noção importante de partido político, que, sem dúvida, ajuda a identificar o verdadeiro partido político, que não se confunde com frentes ou facções.
Neste mesmo sentido, Mohammed Rachid Kheitmi ensina que

“a doutrina política constitui o elemento primordial de um partido político. De fato, tudo deriva dela e tudo se leiga a ela. É assim que a criação de um partido ou a adesão a um partido não se pode conceber sem a adoção de um conjunto de idéias políticas. Em seguida, toda a razão de ser de um partido político repousa essencialmente sobre o triunfo da sua concepção do mundo.”16

Jorge Enrique Romero Perez, no seu livro Partidos Políticos, Po¬der y Derecho, analisa a definição de La Palombara, que faz a dis¬tinção entre “partido e protopartidos”. Para diferenciar um do outro, dever-se-ia analisar os partidos, que seguiam os seguintes critérios:

a) organização durável;
b) organização complexa;
c) existência de uma vontade deliberativa de exercer diretamente o poder e
d) a existência de uma vontade de buscar apoio popular, tanto no nível de militantes, como de eleitores.17

Os protopartidos seriam as organizações que não cumprem esses quatro requisitos. Segundo o autor, seguindo-se este critério, em Costa Rica existiriam apenas protopartidos, sendo que os únicos que se aproximavam de partidos seriam os grupos de liberação nacional e o Partido Comunista.
Romero Perez cita ainda conceituações importantes como a de George Burdeau, que afirma ser o partido político um grupo organizado para participar da vida política com vista a atingir a participação no poder ou obter totalmente esse poder, tendo, ainda, como elemento essencial fazer prevalecer suas idéias e os interesse de seus membros.
Benjamim Constant afirma que o partido político é uma reunião de homens que têm a mesma doutrina política. Manuel Garcia Pelayo reforça o aspecto organizacional, quando explica que

“o partido político se concebe como um grupo de pessoas organizadas com o fim de exercer o poder do Estado ou influenciar sobre ele, para realizar total ou parcialmente um programa político de caráter geral.”

Carl J. Friedrich conceitua partido político da seguinte forma:

“O partido político é um grupo de seres humanos que têm uma organização estável com o objeto de conseguir ou manter para seus líderes, o controle de um governo e com o fim ulterior de dar aos membros do partido, por intermédio de tal controle, benefícios e vantagens ideais e materiais.”18

Parece ser esta classificação totalmente absurda, embora não longe da realidade. Entretanto, acreditamos que o partido, como já vimos anteriormente, é um instrumento por meio do qual se travam lutas democráticas com o objetivo de fazer valer uma idéia de valor geral e não personalista.
Deve-se ressaltar, no conceito de partido político, a ideologia, para se saber por que se chega ao poder e o que fazer com o poder no interesse de toda a comunidade. Deve haver fidelidade a idéia, que vem antes de tudo na organização partidária, não havendo espaço para manifestações de interesses pessoais.
Passaremos à análise dos regimes e sistemas políticos no próximo capítulo, conceituando as várias formas de democracia e de auto¬ritarismo e fazendo uma análise crítica da idéia e problemas contemporâneos da soberania popular como base do poder do Estado.












1 Cf. dissertação de mestrado de SALOMÃO, Daniela Carla da Costa. O Município enquanto pessoa de direito internacional. Defendida no mestrado da PUC/MG, área de concentração em Direito Comunitário, no ano de 2001. BODIN, Jean. Les six livres de la republique. Ouvrage publié avec le concours du Centre National des Lettres. Texte revu par Christiane Frémont, Marie Dominique Couzinet, Henri Rochais, 1986, livre i, p.179 et seq. Verificar ainda a exelente tese de doutorado de Juliana Neunschwander Magalhaes, sobre a evolução conceitual da idéia de soberania a partir do paradigma da teoria sistêmica de Luhmann e Rafaele di Giorgio intitulada Histórica Semantica do conceito de soberania: paradoxo da soberania popular, tese de doutorado apresentada ao curso de pós-graduação da UFMG, 2000.

2 MALMESBURY, Thomas Hobbes. Hobbes. 4. ed., São Paulo: Nova Cultural, 1988, v. I-II.

3 NOZIK, Robert. Anarquia, Estado e utopia. Rio de Janeiro: Zahar, 1991.

4 VIAMONTE, Carlos Sanchez. Manual de derecho político. Buenos Aires: Bi¬blio¬gra¬fica Argentina, 1959, p. 13.

5 VERDÚ, Pablo Lucas. Curso de derecho político. Madrid: Tecnos, 1984, v. II, p. 45.
6 VERDÚ, Pablo Lucas. Op. cit., p. 25-26.
7 DABEZIES, M. Pierre. Cours de droit constitutionnel et d'institutions politiques – Le cours de droit. Paris, 1980, p. 9.

8 “Sobre a influência de uma ciência política, e então ambiciosa, esse ensino primeiramente exclusivamente jurídico abriu-se às realidades do mundo político. Não se ignora mais o papel dos partidos políticos ou dos sindicatos, a influência da religião ou dos exércitos, as conseqüências decisivas do Estado e do desenvolvimento das forças produtivas.” Tradução livre.

9 AGESTA, Luis Sanchez. Sistema político de la Constitución española de 1978. Madrid: Nacional, 1980, p. 150.

10 Folha de S. Paulo, 7/out./1988, Exterior, A-10.

11 Cadernos do Terceiro Mundo, n. 115, p. 33, 1988.

12 DUVERGER, Maurice. Les partis politique. 3. ed., Paris: Armand Colin, 1958, p. 3.
13 “Parece caracterizar, com efeito, toda uma fase da pré-história partidária. Mesmo na Constituinte francesa de 1848, encontrava-se o grupo de palácio nacional e aquele do instituto (Republicanos Moderados), aquele da Rua de Castiglione e aqueles da rua Pirâmides (esquerda)” – Tradução livre.

14 QUINTANA, Linares de. Los partidos políticos, instrumientos de gobierno. Buenos Aires: Alfa, 1945, p. 82-83.

15 SARTORI, Giovanni. Partidos e eventos partidários. Rio de Janeiro: Zahar, 1982, p. 67.
16 KHEITMI, Mohammed Rachid. Les partis politiques et le droit positif français. Paris: LGD, 1964, p. 4-5.
17 ROMERO PEREZ, Jorge Enrique. Partidos políticos, poder e direito. San José/Costa Rica: Sintagma, 1979, p. 3-4.

18 ROMERO PEREZ, Jorge Enrique. Op. cit., p. 9.

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