segunda-feira, 30 de agosto de 2010

35- Entrevista - com Jose Luiz Quadros de Magalhães sobre a Lei da Palmada

Nome: Jose Luiz Quadros de Magalhaes
Cargo/Função: Professor Doutor da UFMG, PUC-MG e FDSM

1. Professor, o projeto de lei que está no Congresso propõe uma modificação no Estatuto da Criança e do Adolescente. Na prática, como funcionaria esse instrumento legal para evitar palmadas, beliscões e outros castigos físicos? O Estatuto não determinava claramente os tipos de castigo?

O PROJETO DE LEI Nº 2564 /2003 da Senhora Maria do Rosário dispõe sobre a alteração da Lei 8069, de 13/07/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e da Lei 10406, de 10/01/2002, o Novo Código Civil. Este projeto estabelece que a criança e o adolescente não podem ser submetidos a qualquer forma de punição corporal mesmo que moderados e sob nenhuma alegação de quaisquer propósitos, ainda que pedagógicos
Sem dúvida trata-se de uma lei absolutamente desnecessária, uma vez que as disposições legais em vigor no país já proíbem e punem qualquer tipo de violência contra qualquer pessoa. O projeto de lei, entretanto, vai além quando pretende proibir “punição corporal moderada” o que pode, e tem sido entendido por alguns como a proibição mesmo da palmada. Neste sentido o projeto torna-se perigoso pois reforça uma tendência de controle total do Estado de toda a vida privada. Obviamente sou contrário a qualquer forma de violência inclusive as palmadas. Acredito também que as palmadas não são educativas, mas acredito que esta questão deve ser resolvida na esfera da moral e da ética, na esfera social e privada sem intervenção do Estado. Se o direito (as leis) pretenderem regular toda a vida nos seus mínimos detalhes não haverá espaço para a importante esfera da ética e da moral. As pessoas farão as coisas para não serem punidas pelo Estado e não porque acreditam que devem fazer. Isto é muito perigoso e sem dúvida, um passo a mais, mesmo que aparentemente pequeno, em direção a uma nova forma de totalitarismo.


2. É possível realizar esse monitoramento? Isto é, o projeto inclui os pequenos atos de castigo corporal. Não pequenos no sentido de irrelevantes, mas por não deixarem marcas facilmente identificadas de maus tratos. Como isso seria avaliado?

Isto incentivará a denuncia, a desconfiança, inclusive dos filhos em relação aos pais. Trata-se de um projeto ruim para a sociedade em todos os aspectos. Mais uma vez reitero ser totalmente contrário a qualquer forma de violência, qualquer forma de castigo físico ou de tortura mental, que pode ser muito pior. Apenas ressalto o perigo de admitirmos a criminalização de tudo. Assim gradualmente o Estado vai tomando conta de tudo. Admitimos primeiro a prisão de pessoas porque beberam, mesmo que um copo de cerveja e dirigiram, agora eles vem com a proibição de castigo físico mesmo que uma pequena palmada. Estão transformando a vida das pessoas em uma penitenciaria.

3. O projeto propõe campanhas de conscientização e até mesmo a inclusão dos direitos humanos no currículo escolar. O senhor acha que a medida será suficiente?

Esta medida sim é muito importante. Dialogar, discutir os direitos, informar e formar as pessoas. Este é o caminho democrático e não ameaçar com punição, prisão. Devemos dizer não a este super-estado.
4. A violência, de qualquer dimensão, é tratada como uma violação dos direitos humanos. Neste caso, direitos na infância e adolescência. Embora não tenha valor como amostragem científica, uma pesquisa entre leitores da Folha de S. Paulo mostrou que mais de 60% dos participantes são contrários ao projeto. Esse exemplo nos leva a um questionamento: o que faz com que, culturalmente, os pais entendam que 'a palmada educa'?

Esta é efetivamente uma questão cultural que não pode ser desconsiderada. Efetivamente os castigos físicos não educam mas a ausência de limites que assistimos em diversas famílias pode ser muito mais perigoso que a palmada. Crianças e adolescentes sem limites podem ser extremamente violentos. A falta de uma repreensão, a omissão dos pais, a tolerância excessiva pode criar pessoas sem limites sociais, que não saberão respeitar o direito dos outros. Justamente por não ser possível viver em sociedade sem limites, sem respeito ao direito do outro, ao espaço do outro, é que, em todas as sociedades as crianças e os adolescentes são educados pelos pais e pela escola, e muitas vezes com a participação da Igreja, com o estabelecimento de punições ou castigos que na história muitas vezes foram castigos físicos. Se acreditamos que não há mais espaço para castigos físicos esta pratica deve ser dialogicamente desconstruída e não simplesmente proibida com outra violência: o direito penal.

5. Que punições estão previstas, caso o projeto seja aprovado no Congresso? Que mecanismos para inibir a violência estão previstos no documento? A denúncia ao conselho tutelar seria suficiente para, por exemplo, a reclusão?


Segundo o Art. 18B, Verificada a hipótese de punição corporal em face de criança ou adolescente, sob a alegação de quaisquer propósitos, ainda que pedagógicos, os pais, professores ou responsáveis ficarão sujeitos às medidas previstas no artigo 129, incisos I, III, IV e VI do Estatuto da Criança e do Adolescente, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.
O Estatuto (Lei 8069 de 13 de Julho de 1990) dispõe no artigo. 129 que são medidas aplicáveis aos pais ou responsável:
I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;
III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;
VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

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