Este artigo foi publicado no Jornal do Brasil no dia 25 de Abril de 2009. Publico aqui novamente para voltarmos a debater a necessidade da criação de uma Corte Constitucional democrática, com mandatos para os seus juizes, renovação periódica e constante de seus membros (o que deveria também ocorrer para todos os tribunais superiores) e nova forma de escolha democrática participativa de seus membros. A TV Justiça nos mostra um espetáculo diário de egos descontrolados de pessoas que se acham melhores do que o restante dos cidadãos. Em uma república os cidadão estão no poder, em uma república os governantes, legisladores, juizes, funcionários, todas as pessoas, seja em que função ou cargo estiverem, ou mesmo sem função ou cargo, todos são iguais, porque todos compartilham o poder. Embora o Supremo tenha recentemente nos oferecido duas decisões de grande importância para a sociedade brasileira (o reconhecimento e a proteção do direito de manifestação pública e o reconhecimento do direito ao casamento homoafetivo) não pode, nenhum orgão ou poder do estado substituir a sociedade (a vontade popular). Se hoje concordamos com estas importantes decisões do STF não podemos aceitar um poder de poucos ocupando espaços que não lhe pertencem, por determinação constitucional: o STF (e todo o Judiário) não pode substituir o legislativo. Se este tem se mostrado omisso deve o povo exigir sua tranformção. As decisões acertadas (na minha opinião e de parcela da população brasileira) podem legititimar outras ações que talvez não concordemos no futuro. E aí? O que faremos, se adimitimos um super poder superior ao povo formado por pessoas que se julgam superiores aos cidadãos (e que não tem pudor em afirmar isto a todo momento por palavras, atos, comportamentos, vestimentas medievais, etc.)?
O Supremo e a República
José Luiz Quadros de Magalhães
(Jornal do Brasil)
O que um homem com uma longa capa preta, com poder vitalício e acreditando ser a consciência moral do país tem a ver com a República? Muitos diriam que nada. A questão da vestimenta e o poder é objeto de diversos estudos e não é um aspecto simbólico do poder que possa ser desprezado. Interessante como que em alguns países republicanos juízes se vestem como cidadãos, mesmo porque, em uma República, juízes são cidadãos e não pessoas especiais. Em uma República o poder se legitima por uma ordem jurídica democrática e é reconhecido por todos os cidadãos, não pela vestimenta, pelo titulo ou pelo sobrenome da autoridade, mas pela seriedade, respeito à Constituição e competência.
O triste episódio do confronto verbal entre dois ministros (Juízes) do Supremo Tribunal Federal, fruto do confronto de enormes `egos` pode ser um ótimo motivo para repensarmos esta instituição e as ações do seu atual presidente. Talvez o Ministro Joaquim Barbosa tenha dito o que muitos brasileiros queiram dizer e não possam, mesmo porque se o dissessem na presença do Presidente do STF estariam presos. Mas esta não é a questão central. O que o Ministro Joaquim Barbosa disse é que o Judiciário não pode ter dois pesos e duas medidas. Em nossa República constitucional e democrática, todos são formalmente iguais perante a lei e isto tem que se tornar efetivo. Portanto não se justifica que enquanto um cidadão que exerce a função de banqueiro seja liberado por habeas-corpus em menos de 24 horas um cidadão desempregado esteja preso há sete meses pelo furto de uma barra de manteiga. Não estou dizendo que o cidadão banqueiro não devesse ser liberado. Se a lei prevê esta hipótese, que seja, mas o problema é que o outro cidadão desempregado não foi. E não foi porque? Não podemos ter um sistema penal que encarcera pobres e solta ricos.
Talvez possamos extrair das palavras do Ministro Joaquim Barbosa que o Supremo Tribunal Federal não é um palanque político. A lógica de seu funcionamento é outra. É obvio que como guardião da Constituição e seu interprete final, os ministros do Supremo tem que julgar levando em consideração o contexto histórico no qual a decisão e o texto legal se insere. Este contexto histórico a que me refiro, obviamente não é o do ministro como pessoa isolada, mas o contexto histórico social e os valores sociais de nossa sociedade plural.
Talvez, com um maior esforço, possamos ainda extair das palavras do cidadão ministro Joaquim Barbosa, que o Supremo não pode substituir o Poder Legislativo e mais ainda, o Supremo não pode substituir a Constituição. O Supremo não pode ser o único interprete da Constituição pois correríamos o risco desta Constituição não mais pertencer a todos os cidadãos. Em verdade o interprete último da Constituição só pode ser toda a sociedade uma vez que as decisões do STF não podem ser tomadas em Versalhes, por um homem de capa preta até o tornozelo, com poder vitalício e acreditando ser a consciência moral superior da nação. Estamos em uma República e cada cidadão tem sua própria consciência moral, segundo valores socialmente e democraticamente construídos.
O que o ministro Joaquim Barbosa não disse é que talvez este seja o momento de um debate público sobre tornar o STF um órgão republicano. Para isto não basta tirar as capas pretas. Isto todos os cidadãos juízes já deveriam ter feito para mostrar que a sua autoridade não esta na roupa mas na sua legitimidade jurídica e no seu conhecimento jurídico reconhecido pela sociedade. Precisamos retomar a discussão de um Supremo Tribunal Federal onde seus Juízes tenham mandatos, onde a escolha de seus membros passe por processos mais democráticos e sua competência seja voltada para o debate público das grandes questões constitucionais.
Vivemos atualmente uma confusão de poderes que precisa ser resolvida. O Legislativo, que deveria debater os grandes temas nacionais como a revisão do pacto federativo e a reforma política, se perde em intermináveis CPI’s inconclusivas, fazendo o trabalho que pertence a Polícia Federal. Como o Legislativo não legisla, neste vácuo de poder o Executivo e o STF o fazem. O presidente do STF faz política, emite opiniões valorativas sobre questões que poderá ter de se manifestar como magistrado esperando reconhecimento público pessoal como um político atrás de votos.
A nossa jovem e poderosa democracia merece uma grande discussão nacional de suas estruturas de poder. Precisamos da reforma política; aprofundar o pacto federativo; rediscutir o presidencialismo; a necessidade ou não da existência do Senado e a constituição de um Supremo Tribunal Federal onde a escolha dos Ministros seja democrática; onde as competências sejam mais específicas; e onde haja a possibilidade de renovação periódica de seus membros.
Precisamos de uma República no Brasil onde todos sejam iguais perante a lei e não haja mais espaço para capas pretas, sobrenomes importantes e projetos pessoais de poder que se sobreponham ao interesse público. A República pertence a todos.
José Luiz Quadros de Magalhães é professor da UFMG e PUC-MG.
Publicado originalmente: Jornal do Brasil – 25/04/2009.
VOCÊ ACREDITA QUE AINDA EXISTEM JUIZES QUE EXIGEM DO ADVOGADO (EXIGÊNCIA INCONSTITUCIONAL) COLOCAR A BECA PARA A AUDIÊNCIA. SE USAR O TERNO JÁ É RIDÍCULO COM O CALOR DOS TRÓPICOS, BECA...
REPÚBLICA JÁ!
LEIAM:
Como diz a D. Léa: esse é o meu garoto!
ResponderExcluirTexto enxuto. Todo mundo lê, entende...
Está até em português...
PARABÉNS, PROFESSOR, ASSIM DA GOSTO,
Anônimo Alfabetizado