QUEM É O LOUCO?
2ª parte
Virgílio de Mattos (1)
Dizia que a razão, sempre fria, exata, produto de cálculo, sempre frio e exato, não serve para explicar nada. Em direito, notadamente em direito penal, sabe-se bem que dois e dois podem ser vinte e dois, ou quatro, ou nada nessa barafunda de soma zero que tenta equacionar todas as diferenças.
Como se ouvíssemos no estádio a locutora anunciando: “A ADEMG INFORMA: SAI A FILOSOFIA, ENTRA A VISÃO ATUARIAL”.
Todos os cálculos de custos são feitos como se estivéssemos tratando com apólices de seguros e não com pessoas inseguras, com medo, sem emprego, sem perspectiva, sem nada.
Parece que voltamos no tempo à segunda metade do século XIX e estamos às voltas com o ‘louco nato’, ou habitual, ou por tendência e, o que é pior, aquele que se transformará em louco pelo eterno rejeitar do mercado de trabalho. Terminará rejeito em uma sociedade de consumo rápido e de descarte ainda mais veloz.
Voltamos ao disparador da loucura e a passagem ao ato. Voltamos aos episódios mais visíveis, e aterradores, da violência. Não a violência das guerras. Não aquela da troca de sangue – sempre dos outros – por petróleo, não a da acumulação e do desperdício: mas aquela que faz com que o cidadão seja diferente, ouça vozes, não consiga fazer laços com o mundo social que o rodeia e acabe sendo laçado por ele. Ou pela pior parte dele que é o controle penal.
E os idiotas da Academia – os hão por toda parte mas parece ser na Academia a ocorrência de sua maior concentração – a referendar a exclusão, a segregação para sempre porque seria óbvio, dizem, que “essas pessoas tem uma coisa”. Têm. Têm contra elas um diagnóstico da biopsiquiatria organicista, vinda também e principalmente do final do século XIX e agora com um arcabouço técnico/teórico impressionante.
Financiados pelos bilhões de dólares da indústria farmacêutica, dizem explicar o inexplicável e omitem apenas suas fontes de financiamento.
Seja Sarkozy, Merkel ou Obama. Seja qualquer um de seus patrões (indústria do petróleo, das drogas lícitas, das “reconstruções” depois que arrasam tudo), a gente fica um pouco desconfiado de perguntar quem é louco nessa história toda.
Nas lutas da história, loucos ou não, os povos têm cheiro de pólvora. Resta saber de que lado estarão do canhão.
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1- Graduado, especialista em ciências penais e mestre em direito pela UFMG. Doutor em Direito pela Università Degli Studi di Lecce (IT). Do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade. Do Fórum Mineiro de Saúde Mental. Autor de Crime e Psiquiatria – Preliminares para a Desconstrução das Medidas de Segurança, A visibilidade do Invisível e De uniforme diferente – o livro das agentes, dentre outros. Advogado criminalista. virgilio@portugalemattos.com.br
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