sexta-feira, 29 de abril de 2011

305- Artigos - A lógica de exclusão moderna no Pacto de Imigração e Asilo da União Européia: nada de novo. por José Luiz Quadros de Magalhães e Carolina dos Reis

A lógica de exclusão moderna no Pacto de Imigração e Asilo da União Européia: nada de novo.


José Luiz Quadros de Magalhães

Carolina dos Reis

RESUMO

O presente artigo aborda a evolução da política européia de imigração e sua contradição com textos europeus e mundiais de proteção aos direitos humanos. Analisa o início da formação da Comunidade Européia e as decisões que conduziram a comunitarização do “problema” da liberdade de circulação de pessoas no território da União, e suas restrições contemporâneas.



Palavras chaves: União Européia. Imigração. Novo pacto europeu de imigração.




1. INTRODUÇÃO



A livre circulação de pessoas no território da União Européia é um desafio que a comunidade européia tenta superar desde o início da construção do projeto de integração econômica.

Inicialmente, a competência para decidir em matéria de entrada e permanência no território era exclusivamente dos Estados-membros. Contudo, o mercado unificado passou a exigir que os países abordassem a questão da circulação de pessoas de forma conjunta. Foram criados diversos grupos intergovernamentais cuja função era, seguindo o acordo de vontades estabelecido entre os Estados participantes, regularizar os critérios para entrada, permanência, concessão de asilo, cooperação civil e outros assuntos relacionados, de forma uniforme.

Somente em 1986 a comunidade européia percebeu a necessidade de conferir uma abordagem comunitária ao tema. Assim, o Ato Único Europeu determinou que a circulação de todos os fatores produtivos era elemento essencial da integração regional.

A partir daí uma série de diretivas, resoluções e tratados foram adotados para inserir o tema na esfera comunitária. As normas mais recentes sobre o tema foram assinadas no ano de 2008 e geraram grande repercussão na mídia, diversos organismos vinculados a proteção dos Direitos Humanos, assim como ativistas em todo o planeta, denunciaram a incompatibilidade destas normas com o sistema de proteção de direitos. Os bens de consumo são bem-vindos, as pessoas não.

Violadoras de direitos ou não, fato é que a União Européia evidenciou na diretiva de retorno e no pacto de imigração e asilo uma política há muito tempo por ela adotada, a de fechamento de suas fronteiras. Este o tema central deste artigo.

2. ORGANIZAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS EUROPÉIAS



Após a Segunda Guerra Mundial ressurgiu a idéia de construir uma unidade européia. A Europa encontrava-se mergulhada em problemas estruturais, econômicos e sociais. Os países precisavam ser reconstruídos e temia-se a expansão da proposta socialista para a Europa ocidental. A União das Republicas Socialistas Soviéticas (URSS) já tinha em sua área de influência diversos países da Europa oriental, e a situação social e econômica da Europa ocidental era terreno fértil para a expansão do socialismo.

Representa perfeitamente o ideal (da elite econômica e política da Europa) de construir uma unidade européia, o discurso proferido por Winston Churchill, no dia 19 de setembro de 1946, na Universidade de Zurique, onde esse conclamou os países europeus a se unirem para reconstruir a Europa e evitar novos conflitos.



“Contudo, é da Europa que nasce esta série de terríveis desavenças nacionalistas desencadeadas pelas nações teutônicas na sua ascensão ao poder a que assistimos no século XX. (...) Alguns pequenos estados conseguiram recuperar bem, mas vastas regiões da Europa apresentam o aspecto de uma massa de seres humanos atormentados, famintos, inquietos e infelizes, que vivem nas ruínas das suas cidades e das suas casas e perscrutam os castelos de nuvens escuras, tirania e terror que se acumulam e obscurecem os seus horizontes, receosos da aproximação de novos perigos. (...) Contudo, existe um meio de o impedir e que, se fosse aceite espontaneamente pela grande maioria da população dos vários estados, transformaria todo este cenário como por milagre e em poucos anos toda a Europa, ou pelo menos a maior parte do continente, viveria tão livre e feliz como os suíços o são hoje.

Em que consiste este remédio soberano? Consiste em recriar a família européia, na medida do possível, e oferecer-lhe uma estrutura que lhe permita desenvolver-se em paz, segurança e liberdade. Temos que construir uma espécie de Estados Unidos da Europa. Só assim é que centenas de milhões de seres humanos terão a possibilidade de recuperar as pequenas alegrias e esperanças que tornam a vida digna de ser vivida. Podemos chegar lá da maneira mais simples. Só precisamos da determinação de centenas de milhões de homens e mulheres em fazer o bem em vez do mal, para receber bênçãos em vez de maldições. (Discurso - Winston Churchill (19/09/1946, Zurique – Suíça).Conselho da Europa. Disponível em: http://www.coe.int/t/pt/com/About_CoE/POR_disc_Churchill.asp. Acesso em: 17 de dezembro de 2008).



Além disso, o plano de ajuda oferecido pelos Estados Unidos da América, conhecido como Plano Marshall influenciou a unidade européia. Esse plano exigia que os Estados europeus estabelecessem conjuntamente os procedimentos de utilização e investimento do auxílio concedido.

O processo de união da Europa começou de forma elitista, forjado por interesses econômicos europeus e norte-americanos e com a participação de lideranças políticas e empresariais distantes do dialogo com a população, que naquele momento sofria com as perversas conseqüências da segunda-guerra mundial. O déficit democrático até hoje incomoda a sociedade e os estudiosos da União européia, não só pela estrutura fechada e distante da população de suas instituições, como também pela reiterada desconsideração das decisões populares em plebiscitos como os ocorridos em relação à Constituição da Europa e o Tratado de Lisboa. A Constituição da Europa foi rejeitada por franceses e holandeses, Constituição esta que se transformou no Tratado de Lisboa, em um claro desrespeito a vontade popular expressa no referendo. O Tratado de Lisboa foi também rejeitado pela única população ouvida sobre sua aprovação: a irlandesa. Mesmo assim as lideranças políticas e econômicas européias insistiram no projeto até sua aprovação.

Na década de 1940 surgiram vários planos de cooperação no âmbito político, econômico e de defesa.

No plano econômico, em 1947, os dezesseis países que aceitaram a ajuda dos Estados Unidos da América se reuniram para estudar a proposta de auxílio (Plano Marshall). No ano seguinte, em Paris, no dia 16 de abril, esses países assinaram uma convenção que criou uma organização intergovernamental cujo objetivo principal era gerenciar e distribuir os recursos provenientes do Plano Marshall, que denominou-se Organização Européia de Cooperação Econômica (OECE). A OECE foi substituída pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Europeu (OCDE) em 14 de dezembro de 1960.

No plano da defesa, foi ratificado no mesmo ano (1948) o Tratado de Bruxelas que instituiu a União Ocidental, que foi alterado em 1954 pelos acordos de Paris, criadores da União da Europa Ocidental (UEO) . Essa organização estabelecia um “compromisso de assistência automática, em caso de agressão armada na Europa” (MARTINS, 2004, p.49).

Ainda no âmbito da defesa, foi assinado no dia 04 de abril de 1949, o Tratado de Washington que fundou a Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN). A função dessa organização é, assim como a da União da Europa Ocidental, segurança mútua entre os Estados em caso de agressão ou ameaça de agressão por países terceiros.

Contudo, a atuação da União Ocidental Européia foi muito limitada. A OTAN assumiu um papel preponderante no plano da defesa.

No âmbito político, foi criado também em 1949, em Estrasburgo, o Conselho da Europa com o intuito de assegurar e proteger os Direitos Humanos na Europa.

Em 1950 foi elaborada no seio do Conselho a Convenção para proteção dos Direitos do Homem e das liberdades fundamentais. Além disso, três instituições garantiam o cumprimento das disposições da Convenção: a Comissão Européia de Direitos Humanos, a Corte Européia de Direitos Humanos e o Comitê de Ministros do Conselho da Europa.

Nota-se, portanto, que em que pese os esforços para a construção de uma unidade européia, o que se alcançou nos primeiros anos do pós- segunda guerra mundial foram acordos internacionais entre Estados soberanos, estabelecidos em conformidade com o direito internacional clássico, ou seja, sem traços de comunitariedade ou de possível construção de um Estado europeu à semelhança do federalismo.





3. FORMAÇÃO DA UNIÃO EUROPÉIA



O ministro dos negócios estrangeiros francês, Robert Schuman, em uma conferência de imprensa realizada em 09 de maio de 1950 propôs ao governo da Alemanha Ocidental, representado pelo ministro Konrad Adenauer a criação de um mercado comum para integrar as indústrias de carvão e de aço dos dois países, uniformizando, assim, o controle da produção.

O convite representou um grande avanço na construção da unidade européia, pois sinalizou a necessidade de superar rancores e desavenças em prol da conservação de espaço econômico, “seu anúncio renovou o abalado convívio diplomático franco-alemão, ao transformar as matérias primas da guerra em instrumento a serviço da fraternidade e do progresso”. (VIAL, 2006, p.21). O romantismo da frase anterior representa o discurso ideológico que se constrói como justificativa da conformação de um espaço comum econômico, projeto que, como visto, contou com o decisivo apoio norte-americano. A construção de uma união econômica e política era tarefa essencial para enfrentar o mundo bipolar do pós segunda guerra mundial. Um forte espaço de economia capitalista na Europa era necessário para enfrentar o desafio da expansão do projeto socialista. O projeto de União da Europa não é um projeto democrático; não é um projeto da sociedade civil européia: é um projeto econômico das elite econômicas européias e do poder norte-americano.

No dia 18 de abril de 1951, foi assinado o Tratado de Paris que fundou a Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA), que entrou em vigor em 1952 e expirou em 2002 (50 anos depois). A criação de uma comunidade que visava controlar, por meio de uma autoridade comum, todo um setor produtivo auxiliou a construção do que hoje conhecemos como União Européia. A cooperação econômica entre as potências capitalistas, que se impunha no pós guerra, em um mundo bipolar, pode ser expressa nos seguintes termos:



“(…) é sobretudo no plano político que se pode avaliar a dimensão inovadora da CECA. Com efeito, foi ela que lançou um processo original baseado na convicção da partilha de um destino comum e com uma visão a longo prazo. A colaboração serena e estruturada entre parceiros pôde assim sobrepor-se à confrontação rancorosa e por vezes violenta entre inimigos. A CECA encontra-se na base do modo de organização original que caracteriza hoje a União Européia, que consiste na criação de um sistema regulamentar autônomo, animado por instituições independentes dotadas dos poderes e da autoridade necessários para fazer funcionar o sistema. Neste contexto, a CECA contribuiu grandemente para a situação de paz, estabilidade, prosperidade e solidariedade que conhecemos hoje na União Européia.(Balanço Gerald a CECA. Disponível em http://europa.eu/ecsc/results/index_pt.htm, acesso em 28 de fevereiro de 2009).”


Os resultados alcançados pela CECA inspiraram a assinatura, na cidade de Roma em 1957, dos tratados constitutivos da Comunidade Econômica Européia (CEE) e da Comunidade Européia de Energia Atômica (EURATOM). Essas comunidades visavam estabelecer uma área de livre comércio que possibilitasse além da diminuição de obstáculos econômicos, a liberdade de circulação de pessoas e serviços.

A década de 1960 é marcada por um grande crescimento econômico. Em 1962, lança-se na CEE uma política agrícola comum (PAC) que conferiu aos Estados membros o controle da produção agrícola, em primeiro de julho de 1968 suprimem-se todos os direitos aduaneiros e cria-se uma zona de livre comércio européia.

Porém, na década de 1970 ocorreu uma retração nos negócios da comunidade em virtude da crise do petróleo. Com o intuito de evitar o desmantelamento do novo mercado regional, em 1979, é criado o Sistema Monetário Europeu cuja finalidade era auxiliar os Estados membros e impedir que esses adotassem medidas protecionistas.



“(...) foi necessário desenvolver novos mecanismos para impedir o déficit orçamental e, ao mesmo tempo, incentivar as subvenções comunitárias e os programas de investimentos nacionais, sem olvidar a justa distribuição econômica, em respeito ao ideal de solidariedade presente nos atos fundadores das Comunidades. (VIAL, 2006, p.23).”



O primeiro alargamento das Comunidades Européias ocorreu em 1973. Inglaterra, Dinamarca e Irlanda se unem a Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Holanda (Países Baixos), formando a comunidade dos nove. Em janeiro de 1981, ocorre o segundo alargamento, a Grécia aderiu a Comunidade após o término do seu regime militar em 1974 .

Em 28 de fevereiro de 1986 foi assinado o Ato Único Europeu (AU) que visou relançar o projeto integracionista europeu, segundo René Vial (2006) o objetivo desse relançamento era pôr fim ao “euroceticismo” que travava o crescimento do projeto de unificação. Foi necessário, portanto, rever a estrutura da comunidade para garantir efetivamente a implementação das liberdades fundamentais.

Neste sentido, tem-se que:



“ O Ato Único Europeu (AUE) revê os Tratados de Roma com o objetivo de relançar a integração européia e concluir a realização do mercado interno. Altera as regras de funcionamento das instituições européias e alarga as competências comunitárias, nomeadamente no âmbito da investigação e desenvolvimento, do ambiente e da política externa comum.(Ato único europeu. Disponível em: http://europa.eu/scadplus/treaties/singleact_pt.htm, acesso dia 28 de fevereiro de 2009).



Em fevereiro de 1992, a União Européia é formalmente instituída por meio da assinatura do Tratado de Maastricht. Ela funda-se nas comunidades européias já existentes (CECA, CEE, EURATOM) e em dois pilares intergovernamentais, quais sejam, na política externa e de segurança comum (PESC) e na cooperação judiciária em matéria de assuntos internos (CJAI), também denominada terceiro pilar.

O terceiro pilar tem por objetivo desenvolver a cooperação no domínio da justiça e dos assuntos internos; construir um mercado sem fronteiras internas e evidencia a necessidade de regras comuns em matéria de asilo, imigração, controle de fronteiras externas, luta contra a criminalidade internacional.

Neste período fica evidente o avanço econômico e político do processo de unificação europeu, mas ao mesmo tempo, e como conseqüência desse avanço, surgem debates sobre a necessidade de ampliar a participação do cidadão europeu nas tomadas de decisão, com uma ponderação de votos mais adequada à integração econômica e social.

Após Maastricht foram assinados outros tratados com o intuito de tornar a união mais efetiva. Assim, em 1997 foi assinado o Tratado de Amsterdã que entrou em vigor dia primeiro de maio de 1999 com o discurso oficial de criar um espaço de liberdade, segurança e justiça. Em 26 de fevereiro de 2001 assina-se o Tratado de Nice que tentou corrigir o déficit democrático da UE e estabelecer um processo de votação mais igualitário, antiga exigência dos cidadãos europeus. E em 2002 lança-se o Euro.

Dessa forma, resultou formado um processo de união entre Estados nacionais. As relações no âmbito da União Européia não são regidas pelo Direito Internacional clássico, essencialmente voluntarista e conseqüentemente sujeito à vontade soberana dos Estados, mas sim por um Direito Comunitário e supranacional, vinculador da vontade do Estado desde o momento em que este consente em integrar a união monetária.


3. POLITICA DE IMIGRAÇAO NA UNIÃO EUROPEIA



3.1 Antecedentes



A história européia está estreitamente ligada à circulação de pessoas. Por volta do século XIII as atividades comerciais eram realizadas em grandes feiras que duravam em media sete semanas. Comerciantes de várias regiões se reuniam para negociar produtos provenientes do oriente. Constantinopla e Alexandria eram os portos responsáveis pelo envio das mercadorias e Gênova e Veneza eram as portas de entrada européia.

Nos fins da idade média ocorreram mudanças que contribuíram para o surgimento de um novo período sócio-econômico na Europa, quais sejam o surgimento gradativo de uma nova classe econômica que nas palavras de A. Souto Maior “era possuidora de imensos capitais investidos em poderosas casas comerciais na Itália, Flandres e na Alemanha” (1996). Ocorre a substituição do sistema feudal por uma monarquia absoluta que centralizou o poder trazendo o progresso da marinha que incentivou novas viagens além mar. Portugal e Espanha apoiados por ricos comerciantes europeus desenvolveram audaciosos planos de navegação, expandiram o comércio com o oriente e lançaram os olhos sobre o oceano Atlântico.

Não tardou para que os portugueses, espanhóis e posteriormente outros estados nacionais, recém constituídos, conquistassem a América que se mostrava como um universo novo e intocado, cheio de riquezas. Muitos europeus migraram para o novo mundo em busca de riqueza ou de um novo lar e de lá extraíram muitas riquezas e deixaram, forçosamente, o modo de pensar e agir dos europeus. Segundo J. Höffner citado por Arthur J. Almeida Diniz:



“(...) o europeu foi ao encontro dos povos conquistados com a consciência de uma superioridade total, mesmo nos casos em que aqueles povos contassem com um passado de milênios... Esse processo foi tão poderoso e indelével que, uma vez terminada a dominação colonial, se tornou impossível o retorno às condições anteriores.” (DINIZ, 1996, 106).





O inicio da modernidade, marcada pela formação dos estados nacionais, fundou-se em três matrizes ideológicas poderosas, que por isto permanecem, em certa medida, até hoje, embora não oficialmente. Embora o discurso de igualdade tenha se afirmado lentamente no final do século XX, a ordem internacional e as relações entre os estados ainda se funda em mitos (idéias falsas) que sustentam ideologias (encobrimentos) como, por exemplo, o mito do selvagem, do oriental e da natureza. Conforme nos lembra Boaventura de Souza Santos , estas três matrizes justificaram, e ainda justificam crimes cometidos pelo invasor europeu nas Américas, África e Ásia. A presença destes mitos ainda hoje e bastante clara:

a) O selvagem como ser inferior, não humano. Assim eram vistas as populações originarias das Américas desde a época da invasão européia nos século XV, XVI e seguintes. A repercussão disto ocorre até hoje, quando finalmente as populações originárias começam a assumir seu próprio destino de forma democrática na Bolívia, Equador (com governos democráticos e novas Constituições) e Paraguai com a eleição de Lugo como Presidente da Republica em 2009.

b) O oriental e o oriente como uma cultura rica que ficou no passado. O inimigo perigoso, pois diferente dos selvagens americanos, tem forte cultura que, entretanto, foi superada pela civilização européia. Os crimes de guerra comuns contra os povos islâmicos pode ser um dos exemplos deste mito, ainda hoje.

c) A natureza como algo a ser domado e explorado, fundamenta toda a relação que ainda temos com o meio ambiente. A natureza é selvagem e nós, humanos, somos postos fora deste espaço. Não somos parte integrante da natureza. A natureza nos oferece recursos a serem explorados. Este mito fundamenta o sistema econômico vigente e nos leva de forma acelerada para a destruição da “espécie” humana no planeta.


3.2- Para a compreensão do Estado moderno como projeto excludente e hegemônico.


A formação do Estado moderno a partir do século XV ocorre após lutas internas onde o poder do Rei se afirma perante os poderes dos senhores feudais, unificando o poder interno, unificando os exércitos e a economia, para então afirmar este mesmo poder perante os poderes externos, os impérios e a Igreja. Trata-se de um poder unificador numa esfera intermediária, pois cria um poder organizado e hierarquizado internamente, sobre os conflitos regionais, as identidades existentes anteriormente a formação do Reino e do Estado nacional que surge neste momento e de outro lado se afirma perante o poder da Igreja e dos Impérios. Este é o processo que ocorre em Portugal, Espanha, França e Inglaterra.

Destes fatos históricos decorre o surgimento do conceito de uma soberania em duplo sentido: a soberania interna a partir da unificação do Reino sobre os grupos de poder representados pelos nobres (senhores feudais), com a adoção de um único exército subordinado a uma única vontade; a soberania externa a partir da não submissão automática à vontade do papa e ao poder imperial (multi-étnico e descentralizado).

Um problema importante surge neste momento, fundamental para o reconhecimento do poder do Estado, pelos súditos inicialmente, mas que permanece para os cidadãos no futuro estado constitucional: para que o poder do Rei (ou do Estado) seja reconhecido, este Rei não pode se identificar particularmente com nenhum grupo étnico interno. Os diversos grupos de identificação pré-existentes ao Estado nacional não podem criar conflitos ou barreiras intransponíveis de comunicação, pois ameaçarão a continuidade do reconhecimento do poder e do território deste novo Estado soberano. Assim a construção de uma identidade nacional se torna fundamental para o exercício do poder soberano.

Desta forma, se o Rei pertence a uma região do Estado, que tem uma cultura própria, identificações comuns com a qual ele claramente se identifica, dificilmente um outro grupo, com outras identificações, reconhecerá o seu poder. Assim a tarefa principal deste novo Estado é criar uma nacionalidade (conjunto de valores de identidade) por sobre as identidades (ou podemos falar mesmo em nacionalidades) pré-existentes. A unidade da Espanha ainda hoje está, entre outras razões, na capacidade do poder do Estado em manter uma nacionalidade espanhola por sobre as nacionalidades pré-existentes (galegos, bascos, catalães, andaluzes, castelhanos, entre outros). O dia que estas identidades regionais prevalecerem sobre a identidade espanhola, os Estado espanhol estará condenado a dissolução. Como exemplo recente, podemos citar a fragmentação da Iugoslávia entre vários pequenos estados independentes (estados étnicos) como a Macedônia, Sérvia, Croácia, Montenegro, Bósnia, Eslovênia e em 2008 o impasse com Kosovo.

Portanto a tarefa de construção do Estado nacional (do Estado moderno) dependia da construção de uma identidade nacional, ou em outras palavras, da imposição de valores comuns que deveriam ser compartilhados pelos diversos grupos étnicos, pelos diversos grupos sociais para que assim todos reconhecessem o poder do Estado, do soberano. Assim, na Espanha, o rei castelhano agora era espanhol, e todos os grupos internos também deveriam se sentir espanhóis, reconhecendo assim a autoridade do soberano.

Este processo de criação de uma nacionalidade dependia da imposição e aceitação pela população, de valores comuns. Quais foram inicialmente estes valores? Um inimigo comum (na Espanha do século XV os mouros, o império estrangeiro), uma luta comum, um projeto comum, e naquele momento, o fator fundamental unificador: uma religião comum. Assim a Espanha nasce com a expulsão dos muçulmanos e posteriormente judeus. É criada na época uma polícia da nacionalidade: a santa inquisição. Ser espanhol era ser católico e quem não se comportasse como um bom católico era excluído.

A formação do Estado moderno está, portanto, intimamente relacionado com a intolerância religiosa, cultural, a negação da diversidade fora de determinados padrões e limites. O Estado moderno nasce da intolerância com o diferente, e dependia de políticas de intolerância para sua afirmação. Até hoje assistimos o fundamental papel da religião nos conflitos internacionais, a intolerância com o diferente. Mesmo estados que constitucionalmente aceitam a condição de estados laicos têm na religião, uma base forte de seu poder: o caso mais assustador é o dos Estados Unidos, divididos entre evangélicos fundamentalistas de um lado e protestantes liberais de outro lado. Isto repercute diretamente na política do Estado, nas relações internacionais e nas eleições internas. A mesma vinculação religiosa com a política dos Estados podemos perceber em uma União Européia cristã que resiste a aceitação da Turquia e convive com o crescimento da população muçulmana européia.

O Estado moderno foi a grande criação da modernidade, somada mais tarde, no século XVIII, com a afirmação do Estado constitucional.

Ao contrário do que alguns apressadamente anunciam, o Estado nacional não acabou, ainda será necessário por algum tempo, assim como a modernidade está aí, com todas as suas criações, em crise sim, mas sem podermos ainda visualizar o que será a pós-modernidade anunciada e já proclamada por alguns. Estamos ainda mergulhados nos problemas da modernidade.



3.3- Migração.



O fluxo migratório Europa –América se manteve durante muitos anos, mesmo depois do fim da colonização. A América “oferecia condições propícias para inovações econômicas, como, por exemplo, a possibilidade de se tentar uma nova estrutura fundiária e agrícola” (VIAL, 2006, p.49).

Porém, no pós-Segunda Guerra Mundial ocorreu uma drástica inversão na corrente migratória. A Europa destruída pela guerra necessitava de mão de obra barata para auxiliar em sua reconstrução. Surgiu, portanto, a figura dos guest workers – trabalhadores braçais, com baixo nível de instrução e provenientes de vários continentes.

Na década de 1960, a Europa sofria como um aumento demográfico causado pela permanência dos guest workers no continente, pela chegada de seus familiares e pelo aumento do número de refugiados que, com fundamento na Convenção de Genebra de 1951 buscavam refúgio na Europa. Em decorrência disso houve uma mudança drástica no padrão das migrações. A oferta de mão de obra passou a ser maior que o número de vagas de trabalho.

Durante a crise econômica de 1970, o número de imigrantes aumentou, várias pessoas deixaram seus países em busca de melhores condições de vida. A taxa de desemprego cresceu e esse se tornou o maior desafio para as recém criadas comunidades européias. A solução encontrada foi estabelecer uma política de trancamento das fronteiras externas. Dessa forma, aqueles trabalhadores estrangeiros antes bem vindos ao território europeu foram considerados os responsáveis pela crise econômica, eram, portanto, figuras indesejáveis.

Não obstante as políticas para impedir a imigração nas fronteiras externas, o número de pessoas que chegavam a Europa na década de 1990 era cada vez maior, o que preocupava sobremaneira os governos. Por outro lado, certos setores privados demandavam a contratação de mão de obra estrangeira altamente especializada para suprir o déficit existente na Europa em virtude do envelhecimento da população economicamente ativa e da queda na taxa de natalidade.

A alternativa foi entreabrir as fronteiras externas para aqueles trabalhadores especializados requisitados pelos setores privados. Assim podemos visualizar dois “tipos” básicos de trabalhadores estrangeiros na Europa: os legalizados, requisitados pelo alto nível de formação e os clandestinos que deixaram seu país de origem em busca de melhores condições de vida.



3.4 Desenvolvimento da política de imigração na União Européia.


3.4.1 Organismos intergovernamentais


As primeiras formas de regulamentação do processo de migração interna e externa nos países europeus do ocidente eram elaboradas individualmente por cada país ou conjuntamente por meio da criação de grupos intergovernamentais, ou seja, sem a participação das instituições da Comunidade Européia. Cada país prefere decidir individualmente quais são os efeitos da migração em seu país.

O distanciamento das instituições da Comunidade Européia na solução das questões relativas à circulação de pessoas propiciou o aparecimento de organismos intergovernamentais, como por exemplo, o Grupo Trevi- Terrorismo; Radicalismo e Violência internacional; Ad Hoc da Imigração; Coordenadores para a livre circulação de pessoas e o Grupo Schengen.

O Grupo Trevi foi criado em 1975 e visava combater o terrorismo e demais crimes internacionais – tráfico de drogas, tráfico de armas e de seres humanos e coordenar cooperação policial entre os Estados participantes.

O Grupo Schengen, principal grupo destinado ao controle de migrantes na Comunidade Européia, foi criado em 14 de junho 1985 por um acordo entre Alemanha, França e os Países do Benelux e entrou em vigor em 1995, com o convênio de Aplicação. Os cincos Estados signatários fixaram regras comuns em matéria de vistos; direito de asilo; de controle nas fronteiras externas; de cooperação entre serviços policiais e aduaneiros. Foi, ainda, instalado um sistema de informação para a troca de dados relativos à identidade das pessoas.

O sistema Shengen vai se tornando aos poucos, um monstro tecnológico de controle sobre as pessoas. Este sistema procura integrar em um arquivo central as fotografias; as impressões digitais; o DNA; e os dados biométricos que serão ligados aos sistemas de reconhecimento facial e de íris dos olhos (SIS II), permitindo com isto uma melhor identificação das pessoas controladas. Este sistema considera, por exemplo, os militantes “altermundialistas” como “pessoas potencialmente perigosas que devem ser impedidas de participarem de encontros internacionais”.

Segundo informações de final de 2001, a base de dados Shengen continha então mais de dez milhões de registros, entre os quais 15% sobre pessoas. Destas pessoas, 90% dos dados são sobre “estrangeiros indesejáveis”.

O Ato único Europeu (1986) conferiu uma nova redação ao artigo 8 -A do Tratado da Comunidade Européia considerou a circulação de pessoas como um dos principais elementos do Mercado único e transferiu para a esfera comunitária os assuntos relativos a essa questão.

“Com efeito, o Ato Único Europeu introduziu dispositivos que possibilitava aproximar a cooperação entre as diversas instâncias nacionais, para, de tal modo, fortalecer o mercado unificado, através da livre circulação de pessoas. Por imperativo metodológico, os organismos da União Européia seriam avisados dos projetos que os Estados-membros continuavam desenvolvendo, preferencialmente, de maneira concertada, evitando, assim, uma prejudicial dispersão de energias. (VIAL, 2006, p.56).”

De tal modo, os grupos intergovernamentais criados após a assinatura do Ato único passaram a contar com observadores da Comissão em sua estrutura.

O grupo Ad Hoc da Imigração, criado em 1986, constituído por Ministros de Estado encarregados das questões da imigração, estabeleceu seu secretariado junto ao secretariado do Conselho da Comunidade Européia para facilitar a comunicação entre sua estrutura e a da Comunidade.

O Grupo Intergovernamental de coordenadores para a livre circulação de pessoas (1988), por sua vez, foi encarregado pelo Conselho Europeu de Rhodes de apontar medidas que permitissem conjugar a livre circulação de pessoas e segurança, depois de suprimido o controle nas fronteiras internas. Propôs, em 1989, um programa de trabalho (documento de Palma) que preconizava uma abordagem mais coordenada dos diferentes aspectos da cooperação em matéria de justiça e de assuntos internos.

Em contrapartida, em que pese a evolução da atuação da comunidade nesses grupos após o ato único europeu, o parlamento europeu e os parlamentos nacionais não exerciam qualquer controle sobre as ações devido a natureza intergovernamental dos grupos.

O tratado de Maastricht estabeleceu que as questões relativas a imigração seriam, dentre outras matérias, tratadas pelo terceiro pilar, ou seja, a Cooperação judiciária e em matéria de Assuntos Internos (CJAI), o qual se baseia na aplicação uniforme das normas dos Estados membros. As soluções tomadas neste pilar não fazem parte do Direito Comunitário, não gozam de primazia, nem efeito direto sobre os ordenamentos jurídicos estatais, são decisões tomadas entre os Estados-membros e aplicadas de forma uniforme.

“No Tratado de Maastricht ficou ajustado que os Estados-membros deveriam buscar informações e cooperarem mutuamente, sob orientação do conselho, que poderia elaborar convenções e recomendá-las aos Estados - membros, levando em conta o processo de reparação adotado por suas normas constitucionais. O Conselho de Ministros poderia aprovar também, outros documentos que refletissem o interesse estatal, sobretudo perante organismos internacionais, mas somente quando os governos não pudessem agir melhor de forma separada (posições e ações comuns)”. (VIAL, 2006, p.57).

As instituições da União possuíam uma atuação limitada nestas questões, o Tribunal de Justiça poderia interpretar as convenções se expressamente previsto no texto do acordo, pacto ou convenção. Não era necessário consultar o Parlamento Europeu. A Comissão Européia possuía direito de iniciativa limitado a certas matérias e partilhado com os Estados-membros. E a atuação do conselho dependia de unanimidade.

O Tratado de Amsterdã assinado em 2 de outubro de 1997, entrou em 1 de maio de 1999 criou um espaço de “liberdade, segurança e justiça” e assim transferiu as questões relativas à circulação de pessoas, controle das fronteiras externas, asilo, imigração, proteção dos direitos dos nacionais de países terceiros e cooperação judiciária em matéria civil para o domínio da Comunidade, ou seja, essas questões serão regulamentadas pelas instituições da União Européia.

O papel do Tribunal de Justiça Europeu é reforçado. O Tratado de Maastricht não previa a atuação do Tribunal em matéria de justiça e assuntos internos (os quais envolvem circulação de pessoas), portanto não era competente para controlar as decisões adotadas pelo Conselho. Sua atuação, como dito anteriormente, se restringia a interpretação caso um acordo ou convenção o previsse previamente.

Assim, o Tratado de Amsterdã, no título IV, (que trata essencialmente sobre circulação de pessoas, do asilo, da imigração e da cooperação judiciária civil) prevê que o Tribunal de Justiça detém competência nas seguintes circunstâncias:

“Uma jurisdição nacional de última instancia poderá requerer que do Tribunal se pronuncie sobre uma questão de interpretação do titulo em causa ou sobre a validade e a interpretação dos atos das Instituições da Comunidade fundamentados neste Titulo se for necessária uma decisão do Tribunal de Justiça para que a jurisdição nacional possa emitir o seu parecer;

Do mesmo modo, o Conselho e a Comissão ou qualquer outro Estado-membro poderão solicitar-lhe que se pronuncie sobre uma questão de interpretação deste Titulo ou de quaisquer actos adoptados com base neste. Contudo, o Tribunal de Justiça não será competente se pronunciar sobre as medidas ou decisões tomadas para garantir a supressão de qualquer controlo das pessoas (cidadãos da União Européia ou nacionais de países terceiros) quando transpõem as fronteiras internas.”

(TRATADO de Amsterdã: liberdade, segurança e justiça. Disponível em http://europa.eu/index_pt.htm acesso em 25/11/2009).

3.2.2. O Espaço de “Liberdade, Segurança e Justiça”.


Após a assinatura do Tratado de Amsterdã o Conselho Europeu de Viena (1998) decidiu convocar uma reunião extraordinária para orientar as instituições comunitárias nos cinco anos seguintes sobre a efetivação do espaço de “liberdade, segurança e justiça”.

É impressionante como as palavras se desconectam de seu sentido originário. Isto é um perigoso anuncio de uma forma mais sofisticada de totalitarismo. Como afirma o filósofo esloveno Slavoj Zizek, vivemos uma luta internacional pela construção do senso comum. Quem é capaz de dizer o que é “liberdade”, “justiça”, “segurança” e “desenvolvimento”, entre outras “palavras-chave” deterá o poder sobre as pessoas e suas consciências.

O Conselho Europeu se reuniu em outubro 1999, na cidade de Tampere, Finlândia para definir quais os elementos necessários à implementação de uma política de imigração da União Européia. Nesta reunião formularam uma Agenda (denominada Agenda de Tampere) destinada a estabelecer os contornos da política de imigração, a qual, em suma, deveria levar em consideração: 1) o fluxo migratório para alcançar o equilíbrio entre admissões humanitárias e econômicas; 2) tratar de forma justa os nacionais de terceiros Estados e na medida do possível lhes atribuir os mesmos direitos e obrigações dos nacionais do Estado em que vivem; 3) desenvolver parcerias com os países de origem.

Em 2004, data limite para a implementação do programa de Tampere, o Conselho Europeu aprovou o Programa Quadro de Haia, em que estabeleceu como objetivo o fortalecimento do espaço de liberdade, segurança e justiça no período de 2005-2010.

Conclui-se que o tratado de Amsterdã ao criar um espaço de liberdade, segurança e justiça reafirma e reforça a idéia (anteriormente descrita no Ato Único Europeu) de que a circulação dos fatores produtivos é elemento essencial da integração regional.

4. DIRETIVA DE RETORNO E PACTO DE IMIGRAÇAO E ASILO

Ana Maria Guerra Martins em seu livro Curso de Direito Constitucional da União Européia (2004) ensina que a diretiva é vinculante quanto aos fins a serem alcançados, porém cabe as instituições nacionais definirem quais os meios para alcançar os resultados nela expressos. Além disso, se destinada a todos os Estados membros deve ser imediatamente implementada, “apresenta-se como um processo de legislação indirecta e é um acto de alcance geral”.(MARTINS, 2004, p.396).

Todavia, não é diretamente aplicável aos nacionais, uma vez destina-se somente aos Estados-membros. Deve ser, portanto, internalizada na legislação nacional para que tenha efeitos sobre os nacionais.

Contudo, ainda, segundo Ana Maria Guerra Martins (2004), se o Estado não proceder a internalização da diretiva no prazo previsto, essa poderá, em certas circunstâncias, ser diretamente aplicável para resguardar os direitos dos nacionais que não podem ser prejudicados pela inércia do Estado.

A diretiva de retorno, aprovada em 18 de Junho de 2008, visou estabelecer um conjunto de normas horizontais aplicáveis aos nacionais de países terceiros que não preencham ou tenham deixado de preencher as condições de entrada, permanência ou residência num Estado-Membro.

Neste sentido, entende-se por nacional de país terceiro uma pessoa que não seja cidadão da União e que não beneficie do direito comunitário à livre circulação.

A diretiva, portanto, prevê uma série de normas para a expulsão de imigrantes ilegais do território da União Européia e evidência uma tendência, há anos iniciada, de considerar o estrangeiro como responsável pelos problemas sócio-econômicos da região. Esqueceram que a Europa explorou recursos de todo o planeta, exportou cidadãos em momento de crise interna, e importou pessoas em momentos de expansão econômica, para depois expulsá-los, como faz em 2009, nos momentos de crise econômica.

Dentre as normas estabelecidas tem-se: 1) os Estados-Membros devem assegurar que seja posto termo à situação irregular de nacionais de países terceiros através de um procedimento eqüitativo e transparente; de acordo com os princípios gerais do direito comunitário, as decisões baseadas na diretiva devem ser tomadas caso a caso e ter em conta critérios objetivos sendo a análise não limitada ao mero fato da residência ilegal; necessários acordos de readmissão comunitários e bilaterais com os países terceiros para facilitar o procedimento de regresso; o regresso voluntário deveria ser privilegiado; é conveniente conferir uma dimensão européia aos efeitos das medidas nacionais de regresso, mediante a introdução de uma interdição de entrada e permanência no território de todos os Estados-Membros, essa interdição não deveria ser superior a cinco anos; o recurso à detenção para efeitos de afastamento deveria ser limitado e sujeito ao princípio da proporcionalidade no que respeita aos meios utilizados e aos objetivos perseguidos.

Sob a luz da diretiva de retorno o Conselho Europeu adotou o Pacto Europeu sobre Imigração e asilo, em 24 de setembro de 2008, que prevê cinco compromissos para o controle das imigrações.

O primeiro compromisso trata sobre a organização das imigrações legais, conforme as prioridades, necessidades e capacidade de recepção do Estado-membro. A reunificação familiar dos imigrantes legais será incentivada desde que os familiares estejam aptos a se integraram à cultura do país e este tenha condições de acolher os familiares.

Ademais, as políticas de imigração serão implementadas para satisfazer as demandas do mercado de trabalho, dar-se-á preferência a profissionais altamente qualificados. Serão implementados programas de informação aos imigrantes sobre seus direitos e deveres e programas que permitam a integração desses ao Estado em que trabalharão.

O segundo compromisso é controlar as imigrações ilegais, neste ponto a União Européia adotou uma postura bem menos tolerante.

Os imigrantes clandestinos deverão deixar o território, o retorno será realizado preferencialmente de forma voluntária, mas em caso de resistência adotar-se-á o retorno forçado, podendo haver restrição da liberdade, por prazo não superior a seis meses.

Cada Estado-membro adotará medidas para garantir o retorno dos imigrantes ilegais. E se comprometerá a receber seus nacionais que estejam ilegais em outros países e deverão reconhecer a decisão de retorno de outro Estado-membro.

O novo pacto prevê, ainda, como terceiro compromisso um controle mais efetivo das fronteiras externas através de maiores investimentos dos Estados-membros nessa área, além de destinarem recursos para “Frontex Agency” .

Deverão, também, ampliar as trocas de informações entre si e gradualmente, de forma voluntária, unir os serviços consulares. Além de auxiliarem, em espírito de solidariedade, as dificuldades daqueles Estados-membros sujeitos a um desproporcional fluxo de imigrantes.

E por fim, o pacto estipula a intensificação da cooperação com os Estados de origem e de trânsito, por meio de: 1) aumento de auxílio financeiro para que estes países invistam em equipamentos e treinamento de pessoal responsável pelo controle do fluxo de migração; 2) celebração de acordos entre a União Européia e estes países para criar oportunidades de migração legal conforme as necessidades do mercado de trabalho europeu; 3) desenvolvimento de mecanismos de imigração temporária, de acordo com o mercado de trabalho interno, para desta forma, promover trocas de experiências entre países a fim de levar ao crescimento de ambos.

Há, portanto, em 2008 um recrudescimento da política de controle da imigração na União Européia, os europeus agora mais do que antes declararam que há um espaço de “liberdade, segurança e justiça” na União, porém este espaço funcionará prioritariamente para os cidadãos europeus. Os estrangeiros serão convidados a compartir desse espaço quando puderem oferecer alguma vantagem para o país que o recebe.


CONCLUSÃO



A Europa ocidental é para muitos um mundo cheio de possibilidades e riquezas. Os habitantes dos países que foram fontes de recursos para as potencias coloniais européias sonham ter acesso a este universo maravilhoso, construído em grande parte pela riqueza explorada de seus países. Porém, sua entrada é altamente limitada. Por que? O que os torna diferentes dos nacionais dos países desenvolvidos?

Bem, a resposta é simples, a pobreza. A mesma pobreza que os Europeus ajudaram a construir através da colonização.

Durante muitos anos os países, hoje, pobres foram explorados pelo velho mundo. Os europeus se lançaram ao mar, ansiosos por mais conhecimento, fortuna e poder. Encontraram terras desconhecidas e cheias de riquezas. Ali habitavam imensas comunidades, com um modo de vida, religião, costumes próprios.

Os recém chegados não se importaram. Os habitantes daquelas terras primitivas eram como animais e deveriam ser educados ao modo europeu. Dessa forma, com a mesma velocidade em que destruíram a identidade do povo, extraíram todos os recursos.

Interessante observar que atualmente são os descendentes destes habitantes escravizados que buscam prosperidade na Europa. Entretanto as portas européias estão fechadas para eles.

A Europa tem o poder que os países conquistados não tinham, o poder de dizer não. O poder de dizer: estrangeiro, aqui você não é bem vindo, sua presença sobrecarrega meu sistema social e aumenta a criminalidade. A Europa não tem qualquer débito com vocês pelos anos de exploração.

Porém, aquele imigrante ultra qualificado, que possa contribuir para o desenvolvimento do continente europeu é bem vindo. Dizem: Você não é um de nós, mas será tratado como tal. É essa a mensagem da política de controle de imigração da União Européia, uma mensagem que vem sendo construída desde o início do projeto de integração política da Europa.

O pacto europeu de imigração e asilo, assinado em 2008, é recente no tempo, seu conteúdo, por outro lado, é muito antigo: estrangeiro, você algumas vezes é o inimigo e outras um mal necessário.





REFERÊNCIAS

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VAN BUUREN, Jelle. Manière de voir 71, Le monde diplomatique, Paris, octobre-novembre 2003, page 24.

BADIOU, Alain. Lê Siécle, Editions du Seuil, Paris, 2005.

BATISTA, Vanessa Oliveira. União Européia: livre circulação de pessoas e direito de asilo. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.

MAIOR, A. Souto. História Geral. São Paulo: Companhia Editorial Nacional, 1996.

MARTINS, Ana Maria Guerra. Direito Constitucional da União Européia. Coimbra: Aldemina, 2004.

VIAL, Renê. Política Comunitária de Imigração: A situação jurídica dos trabalhadores extracomunitários no espaço de liberdade, segurança e justiça da União Européia. Belo Horizonte, 2006.

WILLIAMS, Raymond. “Palavras-chave (um vocabulário de cultura e sociedade)”, Boitempo editorial, São Paulo, 2007.

ZIZEK, Slavoj. “Plaidoyer em faveur de l’intolerance”, Éditions Climats, Castelnau-le-lez, 2004.

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DISCURSO - Winston Churchill (19/09/1946, Zurique – Suíça) Conselho da Europa. Disponível em: http://www.coe.int/t/pt/com/About_CoE/POR_disc_Churchill.asp.n Acesso em: 17 de dezembro de 2008.

EUROPA Glossário. União da Europa Ocidental. Disponível em:C:\DocumentsandSettings\us\Meus documentos\Direitos Humanos e União Européia\EUROPA - Glossário - União da Europa Ocidental (UEO).mht. Acesso em: 17 de dezembro de 2008.

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ORGANIZAÇÃO para a cooperação econômica européia. Disponível em Wikipedia.http://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza%C3%A7%C3%A3o_para_a_Coopera%C3%A7%C3%A3o_Econ%C3%B3mica_Europeia. Acesso em: 16 de dezembro de 2008.

SOBRE a OCDE: Informações Gerais. Disponível em http://www.cgu.gov.br/ocde/sobre/index.asp. Acesso em: 16 de dezembro de 2008.

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