domingo, 23 de dezembro de 2012

1280- O que é uma sociedade ética? Não é a sociedade do STF. Coluna do professor Jose Luiz Quadros de Magalhães


Quem diz o que é ético?
por José Luiz Quadros de Magalhães


                O que é uma sociedade ética? Uma sociedade ética é uma sociedade que acredita que os valores que sustentam suas relações podem ser incorporados por todos: as pessoas agirão eticamente por que acreditam que a conduta ética é o melhor caminho e não por que têm medo do direito penal, do Joaquim Barbosa, do aparato estatal. Respeito o outro por que estou convencido que este é o melhor caminho e não porque tenho medo da repressão.
            Um pergunta necessária: Quem diz o que é direito, o que é justo, o que é legal, o que é normal, o que é crime¿ O que é crime em uma sociedade pode não ser crime em outra sociedade, o que é crime em um momento histórico pode não ser crime em outro momento. Crime é um conceito histórico, como são conceitos históricos "justiça"; "direito"; "normalidade" e "anormalidade".
            Quem diz o que é normal. Ora, a resposta é fácil de ser encontrada: quem tem poder para dizer. E quem tem poder para dizer¿ Ainda hoje, tem poder para dizer, quem detém o controle do poder econômico, do poder do estado, quem controla os aparelhos ideológicos e repressivos do Estado moderno. Será que existe alguma conexão, em alguns países, o fato do crime de usura (cobrar juros altos) não ser mais crime com o fato dos recursos para financiamento da campanha eleitoral vir em grande medida dos Bancos¿ Será que podemos relacionar o fato dos parlamentares de algum país, descriminalizarem a usura, com o fato das campanhas eleitorais serem financiadas por banqueiros¿ Esta afirmação não se relaciona com nenhum fato específico. Convém entretanto pesquisar a respeito. Isto é somente uma hipótese para reflexão.
            Uma reforma estrutural no sistema político; a adoção do financiamento público de campanha; a proibição de reeleição; estas e outras medidas poderiam ajudar no combate à corrupção. Poderíamos dizer que seria um passo importante, mas ainda não chegaríamos ao núcleo do problema. Trata-se do inicio de um reforma estrutural do sistema político mas que ainda necessita de transformações nas estruturas sociais, culturais e econômicas que geram a corrupção. Lembremos o conceito inicialmente trabalhado. Impossível resolver a violência subjetiva sem eliminar a violência objetiva e simbólica. O mesmo vale para a corrupção: impossível resolver a corrupção subjetiva sem a eliminação da corrupção objetiva (estrutural) e simbólica, permanentemente presentes em uma sociedade fundada sobre valores egoístas, materialistas e competitivos. Impossível eliminar a corrupção quando esta é incorporada como valor social e legalizada em diversos aspectos.
            Uma pergunta: e se o parlamento fosse integrado por pessoas corruptas que transformassem em lei práticas corruptas. Em outras palavras: e se legalizassem a corrupção como legalizaram a usura¿
            O conceito de ética e de corrupção deve ser uma construção conjunta, livre, dialógica, consensual em uma sociedade livre das engrenagens corruptas presentes nas estruturas sociais, econômicas e políticas modernas e fortemente impregnadas nos elementos simbólicos das representações de mundo presentes em nossos cotidianos. Em outras palavras: acabar com a corrupção exige compreender as estruturas objetivas e simbólicas da sociedade capitalista construída na modernidade e eliminá-las. Sem isto ficaremos permanentemente repetindo políticas públicas pontuais reapresentadas periodicamente com nova embalagem, políticas estas que não funcionaram no passado e não funcionarão no futuro.

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