A CLASSIFICAÇÃO DAS
CONSTITUIÇÕES 2
José Luiz Quadros de Magalhães
3 CONSTITUIÇÃO RÍGIDA E FLEXÍVEL
A tradicional classificação entre Constituições rígidas e flexíveis diz respeito aos aspectos formais de alteração do texto da Constituição. Uma Constituição rígida dispõe de mecanismos processuais que dificultam a alteração do texto, estabelecendo um processo legislativo que protege a Constituição contra alterações constantes ao dispor sobre:
a) limitações a iniciativa de emendas (limites formais do poder constituinte derivado - poder de reforma);
b) criação de um quorum diferenciado mais difícil em relação as leis ordinárias e complementares;
c) existência de outros limites temporais, materiais, circunstanciais e formais que dificultem a alteração do texto.
As Constituições rígidas, portanto, têm processos que limitam a alteração do texto, impedindo que ele texto seja alterado por procedimentos legislativos semelhantes aos adotados para a alteração ou criação de uma lei ordinária ou uma lei complementar. A Constituição brasileira de 1988 estabelece esses limites já estudados quando tratamos, em outro momento, do poder constituinte derivado e seus limites. São exemplos desses limites que caracterizam a rigidez da Constituição Federal:
a) a iniciativa de emenda só será do Presidente da Republica, de 1/3 dos senadores ou dos deputados federais ou por mais da metade das assembléias legislativas dos Estados-Membros em decisão de maioria relativa de seus membros;
b) o quorum de aprovação de emendas será de 3/5 em dois turnos de votação, nas duas casas separadamente (Câmara dos Deputados e Senado);
c) há limites materiais ao poder de reforma no art. 60 § 4º, incisos I a IV;
d) há limites circunstanciais na proibição de funcionamento do poder de reforma durante estado de sítio, estado de defesa e intervenção federal.
Diante dessas circunstâncias, podemos perceber que as Constituições rígidas têm graus diferentes de rigidez, não havendo um único modelo rígido de Constituições mais ou menos rígidas, sendo a característica de rigidez fundamental para a caracterização da supremacia da Constituição e de sua proteção.
De forma diferente, as Constituições flexíveis perdem sua característica de supremacia e se tornam vulneráveis comprometendo a segurança buscada pelo constitucionalismo moderno. A flexibilidade se caracteriza pela inexistência de processo legislativo diferenciado para alteração do texto constitucional, que poderá ser modificado pelo mesmo processo e com o mesmo quorum exigido para se elaborar uma lei ordinária. Dessa forma, desaparece, na prática, a superioridade hierárquica da Constituição em relação às leis ordinárias.
A Constituição brasileira de 1824 foi um exemplo de Constituição semi-rígida, tipo que se caracteriza pela existência de dispositivos com a proteção da rigidez constitucional e outros não, podendo-se alterar parte do texto pelo processo legislativo simplificado de uma lei ordinária.
Essa classificação é, ainda hoje muito importante para que possamos compreender a importância da rigidez constitucional e mantenhamos a proteção ao texto constitucional contra mudanças radicais que comprometem a estabilidade e a essência do constitucionalismo, como defendido por alguns.
A rigidez constitucional e a decorrente supremacia da constituição em relação as outras normas jurídicas é a essência do constitucionalismo moderno e grande conquista na proteção dos direitos fundamentais. O desaparecimento dos limites ao poder constituinte derivado representa o comprometimento do estado de direito e da segurança jurídica que esse estado deve oferecer.
Sabemos, também, que a Constituição muda não apenas por meio da alteração do seu texto. A mudança do texto é apenas um mecanismo de atualização e aperfeiçoamento da Constituição. A Constituição também muda, evolui e se atualiza com a mudança de sua interpretação. Portanto, mudando a sociedade e os valores dessa sociedade, muda o olhar sobre o texto e mudam os significados dos diversos significantes, que são as palavras, regras e princípios. Uma conexão que é possível se estabelecer a partir dessa constatação, é a de que, numa tradição de textos analíticos, detalhados, com um grande número de regras, há restrição maior as mudanças interpretativas e, portanto, maior necessidade de mudanças formais do texto, enquanto, numa tradição de texto sintético, principiológico, os processos de mudança interpretativos superam os processos de mudança do texto que, por esse motivo, não são tão necessários. Isso explica, em parte, a razões do maior número de emendas em textos analíticos do que em textos sintéticos. Um exemplo é o número de emendas ao texto da Constituição dos Estados Unidos da América (27 emendas em 216 anos) e ao texto brasileiro (66 emendas em 22 anos).
Nenhum comentário:
Postar um comentário