quinta-feira, 6 de setembro de 2012

1237- Militantes não morrem, ficam encantados - Coluna do professor Virgilio Mattos


        MILITANTES NÃO MORREM, FICAM ENCANTADOS
                                   Virgílio de Mattos
        Confesso-lhes que a notícia me pegou como uma patada no estômago. Fiquei triste o resto do dia e me perguntando, como sempre faço em momentos como este: como é que tem tanto filho da puta - com todo o respeito que me merecem as putas – com boa saúde e um companheiro desses morre?
        A última vez que o vi foi no final de maio de 2010 e ele estava bem. Aliás, o título da entrevista que a revista FORUM (n. 101) publicou foi exatamente este: ESTAMOS TODOS BEM, quando lhe perguntei sobre a sua ex-companheira e os filhos dela sequestrados junto com ele por uma operação conjunta entre o serviço de informações uruguaio e o DOPS de Porto Alegre, nos tempos ainda mais sombrios de Operação Condor.
        Universindo Diaz, como o conhecemos no Brasil ou Universindo Rodriguez, como o conhecem no Uruguay, me pareceu alegre, bem disposto, ágil de corpo e mente e com um senso de humor difícil de encontrarmos no Uruguay, principalmente entre os militantes, sempre tão literais e sisudos.
        Em 2011 ainda tentei trazê-lo de novo ao Brasil para que fizesse o encerramento do IVº Seminário Antiprisional Desconstrução das Práticas Punitivas e ele declinou amavelmente, depois de minha irritante insistência, tanto com ele, quanto com os amigos dele. Tinha outras tarefas.
        Ele era assim: um sujeito simples e extremamente corajoso. Desde o exílio na Suécia resolveu voltar e tornar a arriscar a vida – já havia arriscado tudo mesmo – no Cone Sur. Sabia bem dos riscos e das consequências. Resolveu arrostar todos e todas, riscos e consequências entenda-se.
        Seu endereço eletrônico trazia o seu número de prisioneiro no penal Libertad. Memória e luta. Trabalhava em um bom lugar e se orgulhava da pesquisa de história oral que realizava, aliás foi a desculpa que utilizou para não vir ao Brasil no seminário: coincidência de datas.
        Coincidência de tragédias, o filho de camponês do norte do Uruguay não pôde formar-se em medicina, como sonhava na juventude. Formado historiador sua história se confundiu com a nossa história e a história dos lutadores por dias melhores, por menores que sejam as chances.
        Universindo Rodriguez Díaz foi um exemplo, sobretudo de humildade para as gerações mais novas. Pessoas como ele fazem falta em um mundo tão perverso e sombrio como este que temos a infelicidade de habitar.
        Militantes como ele não morrem, ficam pra sempre encantados como uma estrela. Uma estrela vermelha no firmamento.
        Queria te dizer, meu chapa, que você deixa tristeza e saudades, mas sobretudo o exemplo – tão firme, tão digno – de luta. Com sua ausência não ficamos nada bem.
        Busco consolo em Mário Benedetti, um poeta querido em comum:
        Lento pero viene
        El futuro se acerca
        Despacio
        Pero viene.
        A hora dos nossos inimigos comuns está por chegar, pena você não estar mais por aqui pra enxergar.
        Vai na paz!

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