domingo, 23 de outubro de 2011

766- GRAVE DENÚNCIA

DESPEJO DA COMUNIDADE ZILAH SPOSITO SEM MANDADO JUDICIAL É DITADURA, É CRIME.

Terrorismo da Prefeitura de Belo Horizonte e da Polícia Militar de Minas.
Ontem, dia 21/10/2011, no Conjunto Zilah Sposito, em Belo Horizonte, fiscais, gerentes e guardas municipais da Prefeitura de Belo Horizonte – PBH -, juntamente com a Polícia Militar de Minas Gerais – Tropa de choque – cometeram um grande crime na capital mineira: Sem Mandado Judicial, com forte aparato bélico, usando spray de pimenta e terrorismo psicológico, destruíram 24 casas de alvenaria, barracos de lona e casas que estavam em início de construção. O pior: destruíram a vida e o sonho de 39 famílias que ficaram sem teto, ao relento, sob o frio e uma noite de chuva. Violaram covardemente direitos e dignidade humana, Havia casas construídas há vários meses. A ocupação de um terreno da prefeitura foi espontânea e lenta. Metade das famílias não havia recebido, previamente, nem notificação da prefeitura. O povo que resistia dentro das casas foi enxotado com spray de pimenta. Muitas crianças receberam spray de pimenta no rosto.
Foi de uma brutalidade terrível o que aconteceu, por exemplo, com Ricardo e sua esposa: com um filho de 4 anos com problema de asma, resistiam dentro da sua casinha de alvenaria, construída com muito sacrifício. Desempregados, sob pressão dos fiscais e de policiais diziam que não sairiam de dentro da casa, seu único refúgio no mundo. Policiais da tropa de choque começaram a jogar spray de pimenta dentro da casa, pela porta e por todos os buracos, abaixo das telhas de eternit. A criança, com asma, estava sendo asfixiada pelo spray de pimenta. A mãe, temendo a morte do filho, acabou entregando a criança para um fiscal, que disse aos policiais: “jogue spray de pimenta na criança que a mãe e o pai sairão da casa.” Ao ver os jatos de spray de pimenta no rosto do filho de 4 anos, já se asfixiando, a mãe e o pai, desesperados, saíram da casa para tentar socorrer o filho. Os fiscais perceberam que não havia condições de entrar na casa para retirar os móveis e todos os pertences da família por causa do spray de pimenta por eles injetado. A casa foi derrubada por cima de todos os poucos pertences, o que a família possuía.
Uma senhora de 68 anos, com problema de coração e pressão, ao voltar para casa, foi impedida de aproximar da sua casinha. Após driblar a polícia e entrar por outro lugar, resistia dentro de casa, em estado de choque, na iminência de desmaiar. Um fiscal disse a ela que poderia sair que a casa dela não seria destruída. Ela saiu e, de joelhos, sob estado de choque, implorando misericórdia, viu sua casa ser totalmente destruída.
A prefeitura alegou que lá é área de risco e há risco de desabamento. Isso é mentira. O povo é pobre, mas não é bobo, não construiu em área de risco. Os 30 metros ao lado do córrego, APP, estavam sendo preservados. Sob o argumento de que seria área de risco, a Prefeitura foi quem colocou em risco a vidas destas pessoas com a maneira como as tratou e deixando-as ao relento.
Fazer despejo sem ordem judicial, só com código de postura, é ditadura, arbítrio. Várias famílias estavam trabalhando e, ao serem informadas que a PBH e a polícia estavam derrubando suas casas, largaram o trabalho e voltaram para casa, mas foram impedidas de chegar a suas casas, pois havia um cordão de isolamento da área feito pela polícia. Inclusive, muitos apoiadores/ras que chegaram, foram impedidos de acessar o local do arbítrio, da truculência e da agressão à dignidade humana de centenas de pessoas.
Às 18:00hs de ontem, a Defensoria Pública do estado de Minas conquistou junto ao Poder Judiciário uma decisão judicial, em forma de Liminar, que garante as 9 casas que restaram em pé e a permanência das famílias no local. Sem mandado judicial as famílias não poderão ser despejadas e as casas não poderão ser derrubadas. O Ministério Público fez perícia no local. O Programa Pólos de Cidadania da UFMG, as Brigadas Populares, CPT, MLB e outros movimentos populares estão acompanhando as famílias que foram profundamente agredidas na sua dignidade. Despejo feito de forma ilegal, sem nenhuma alternativa digna.
Quase todas as famílias ficaram ao relento, sob o frio e uma noite chuvosa. Algumas famílias foram acolhidas por vizinhos. Não houve confronto, porque o povo é humilde, pobre e estava desarmado. O povo resistiu com seu próprio corpo. Sob spray de pimenta e sob a mira das armas, como confrontar?
Clamamos por justiça! Exigimos julgamento e condenação desse crime, indenização às famílias e moradia popular digna para todas as famílias. Jamais problema social se soluciona com repressão. A injustiça social campeia na região do Zilah Sposito.
Aos fiscais, gerente da prefeitura e aos policiais que executaram uma ordem ilegal, injusta e covarde, dizemos: Ninguém está obrigado a obedecer a regras, leis e ordens injustas! A lei maior de Deus diz: Não Matarás! Ou seja, faça viver! Vocês também têm filhos e parentes idosos. Não esqueçam que vocês pertencem à classe trabalhadora. Por que violentar seus irmãos?
Clama aos céus a maneira como a prefeitura de Belo Horizonte está tratando os problemas sociais, sobretudo, a questão da moradia nesta Capital. Esta ação no Zilah Spósito demonstrou o cúmulo da truculência, da covardia e da criminalidade praticada por quem está para garantir proteção e direitos fundamentais. Guarda Municipal não tem a função de realizar despejos. Isto é desvio de função. Realizar despejos sem mandado judicial, sem assegurar reassentamento das famílias, sem respeitar os diretamente envolvidos, é violação aos direitos humanos. Precisam ser punidas a/as autoridade/s que se submetem a esta covardia.

Contatos para maiores informações:
Joviano Mayer cel.: 31 8815 4120
Júnior, cel.: 31 9130 6490
Índio, cel.: 31 8521 6820 ou 31 9882 0334
Frei Gilvander, cel.: 31 9296 3040.

Belo Horizonte, MG, Brasil, 22 de outubro de 2011


Um abraço afetuoso. Gilvander Moreira, frei Carmelita.
e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br
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skype: gilvander.moreira

765- E Bush Junior? - Coluna do professor Virgilio Mattos


E BUSH JÚNIOR?
                                  Virgílio de Mattos
            “Não substituir o povo. A representação é uma impostura”
Muammar Al Kadhafi, no Livro Verde, p. 25
 Toda una vida de caerse y levantarse para seguir peleando a corazón partido. Hasta que los tiempos cambian. El amor madura, el odio muta en dolor, se aprenden nuevas formas de lucha. Por los que vienen y por los que ya no están, los sobrevivientes renacen y vuelven a empezar, para no morir.”
Santiago O’Donnell, no Página 12 de hoje.
Trucidado em Sirte, sua terra natal, o governante líbio – herói de minha adolescência e de minha geração - resistiu até a morte. Uma sábia amiga muito querida, de mais idade e daquela região, censurou-lhe a “ingenuidade”. “Não estava armado? Tinha que ter se matado”.
Às vezes não dá. A maldade humana é pegajosa demais, é sensível a dinheiro demais é envolvente demais.
Kadhafi resistiu durante mais de quarenta anos (e, obviamente fez muita merda nesse tempo todo, mas olhe você para sua própria vida e perceba a quantidade de merda que já fez. Afinal merda literal a gente faz todo dia.). Assim como a Palestina está ocupada e resiste há quarenta anos, assim como meu amor pelo socialismo científico fez quarenta anos, assim como a primeira ação militar do ETA fez quarenta anos.
Os tempos mudam. A vida muda. A gente muda a vida e é mudado pela força inexorável da passagem do tempo.
Obviamente que só o passar do tempo vai aclarar quem foi o informante (a nacionalidade é marroquina e a profissão é mercenário) e quem foram os executores (sabe-se de paramilitares colombianos da temível organização de direita Autodefensas Unidas de Colômbia estiveram com o prisioneiro em seus últimos momentos e faziam relatos via rádio aos seus patrões do Qatar e EUA).

        Não gostaria e não vou lembrar-me dele enxugando o abundante sangue que lhe escorre do lado esquerdo do rosto, ainda incrédulo, talvez, com o fim do fim tão próximo.
        O desrespeito ao corpo morto não é nada comparado àquele sofrido pelo corpo ainda vivo.  Vi vários ferimentos de pequeno calibre (9 mm?) no tórax e dois no rosto (no frontal e logo acima do maxilar, do lado esquerdo) com “marca de tatuagem nas bordas” que é o que a gente aprende em medicina legal como característica principal de disparo à queima roupa.
        Nenhuma comemoração a ser feita. A menos que você seja executivo de companhia de petróleo. Ou um filho da puta – ia escrevendo, mas refreei-me a tempo.
        Um mártir. Viveu como um catalisador que fez de várias tribos um país. Morreu como um mártir.
        Quero ver o que irá virar a Líbia, que com ele era um país. Um monte de tribos esparsas de novo?
Sob o jugo da potência hegemônica da vez?
        Enquanto seus inimigos ainda comemoram não me canso de me perguntar: e o final de Bush Júnior, como será?

764- De aparecer apareció pero en una lista de desaparecidos...



763- O bem e o mal - cinema espirita.

Na ultima postagem sobre cinema sugerimos filmes sobre o bem e o mal, o céu e o inferno. Imperdível é o filme "Sem noticias de Deus". Continuando na mesma linha sugerimos filmes de inspiração espirita. Nos ultimos anos tem crescido o numero de pesquisas nas universidades sobre a comunicação com os mortos. Teses de doutorado tem sido desenvolvidas sobre o tema. Para pensar um pouco o filme acima é bonito e contundente. Abaixo um filme espirita de nosso querido Chico Xavier. Uma homenagem a cidade de Uberaba. Linda cidade.
Abaixo o filme sobre Bezerra de Menezes.
Abaixo o filme sobre Chico Xavier.
Alguns filmes sobre espiritos para distração:
O filme "O céu pode esperar" é um clássico com Warren Beaty, e mais acima, um filme muito bom com Meryl Streep, divertido e inteligente.
Confiram, a morte pode ser leve e sem dúvida um aprendizado.
Espiritualidade é diferente de religião. É preciso pensar à respeito. Existem religiões que são mais materialistas que muitos "shopings centers".
Evolução espiritual talvez possa ser o oposto de "prosperidade material", apego ao dinheiro, sucesso, carros e bens materiais acumulados. Os egipicios tentaram levar tudo isto para o túmulo e não deu certo. Porque alguns continuam tentando?

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

762- In Gold they trust - Coluna do professor Virgilio Mattos


IN GOLD THEY TRUST[1]
                   (Sempre sob a proteção de deus)
                          Virgílio de Mattos[2]
         Uma organização de ensino jesuíta – quem diria?! – convida-me para debater o tema AS CONVICÇÕES RELIGIOSAS DEVEM SER CONSIDERADAS NAS DECISÕES E NOS DEBATES POLÍTICOS, EM CONTEXTO DE PLURALISMO?
         Não sou o mais indicado para essa questão/dúvida, pois que à pergunta impõe-se um sonoro e definitivo NÃO como resposta. Rápido, simples, irretorquível.
         Não chega a ser uma questão propriamente, talvez uma das questões fundamentais seja por que “a garantia incondicional da propriedade privada absoluta só pode existir ali onde a religião seja uma questão privada, onde novamente ela seja também o princípio regente”? E isto não é dito por um teórico marxista, mas pelo mais elaborado pensador nazista, embora Menelick de Carvalho Netto a denomine (pensar Schmitt como teórico nazista) de equivocada porque não havia um Reich em 1925, e nessa parte – a inexistência de um Reich em 1925 - ele tem razão.
         Não pesquiso convicções religiosas, muito menos pluralismo. Mas creio que gostariam de dar voz, ainda que na qualidade de debatedor, a um agnóstico convicto. Muito simples, sincero e tranquilo com isso, mas convicto. Embora conviva bem com todos aqueles que respeitam o que dizem que disse deus (não importando muito o seu nome em uma teologia monoteísta), nutro uma antipatia difícil de esconder, mesmo se quisesse, quando percebo que utilizam a máscara da religião para venda de um lugar no céu. A maioria dos que conheço, vários jesuítas inclusive e sobretudo, fazem o jogo do lucro com a palavra do Senhor. Talvez este o punctum saliens do convite.  Ou mesmo a ideia de um complexio oppositorum que o perigosíssimo Carl Schmitt desenvolvia no seu Catolicismo Romano e Forma Política, onde já de início advertia:
         Há aqui, nas forças religiosas e políticas, um sentimento anti-Romano que alimentou a luta contra o Jesuitismo, o papismo e o clericanismo, e que impulsionou a história européia por séculos. Não somente sectários fanáticos, mas gerações inteiras de pios protestantes e de cristãos gregos ortodoxos viram em Roma o anticristo ou a prostituta babilônica do apocalipse. O poder mítico dessa imagem é mais profundo e mais forte do que qualquer cálculo econômico; e seus efeitos de longa duração”.[3]
         De formação criminólogo, penso sempre a clássica pergunta primeva: “a quem interessa?” Antes de tudo, antes mesmo do desjejum cotidiano de um militante de direitos humanos, que basicamente consiste em comer uma fruta, beber uma caneca de chá acompanhada de umas fatias de pão com queijo, recém chegado à classe “C”, que cresceu como “nunca antes na história desse país”, e escolher que inimigo combater naquele dia. A fila é sempre imensa. A escolha por quem e onde começar sempre difícil.
         Invariavelmente os prepostos de deus[4] e falsos intérpretes das palavras atribuídas a seu filho estão entre aqueles que merecem ser combatidos, prioritariamente, impiedosamente, assim como têm feito de forma autofágica através dos tempos, a própria igreja católica; não gosto de utilizar a imagem mais é muito própria: em suas lutas intestinas. Não digo mais do que nunca e nem mesmo mais do que antes. Meu espaço é curto como o cobertor do pobre no frio.
         A primeira premissa é a de que todos têm que ser respeitados por suas convicções políticas e religiosas, como estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil[5], a quem muito modestamente emprestei as costas para que fosse aprovada. [Um necessário parêntesis abro: Melhor explicando isto: muita pancada com cassetete da Tropa de Choque da Polícia Militar, em especial a truculenta do Estado de Minas Gerais, de todos os tipos – só não apanhei de tonfa, essa modernidade, mesmo porque não tenho mais idade e nem saúde pras essas coisas] E deu no que deu conforme estamos fartos de apontar. Mas na CRFB, cujo preâmbulo narra que tudo foi feito sob a proteção de deus, grafado em maiúsculas, que não é, tecnicamente, uma constituição ruim, ali assim está expresso: Art. 5º - VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.
         Uma questão que se impõe é por que a interpretação da Constituição, exatamente pela constituição de classe de seus constituintes e intérpretes obrigatórios (cf. Art. 102, caput), não pode garantir a interpretação de si mesma como hipótese de indagação de proteção aos cidadãos contra a proteção de uma constituição que não nos protege contra ela mesma – e aqui Menelick de Carvalho Netto apertaria os olhos e com eles riria concordando e acenando afirmativamente com a cabeça.
         A Constituição não nos protege contra a religião? É óbvio que sim, no texto; mas é também óbvio que não, no cotidiano massacre imposto aos cidadãos pela histeria neopentecostal e também a do papa, aliás Maledetto XVI, como alguns amigos da Itália – grande parte católicos – apodaram o atual sumo pontífice, a meu modesto juízo concorrente forte a ocupar o trono de “um dos piores dos últimos tempos”, em área onde a disputa é dura e a vitória ignóbil. Mas tem feito por onde, admitamos, ao gastar 6 mil euros em uma recente veste, digamos de modo elegante, desnecessária completamente em tempos de ruína econômica, extracomunitários[6] que se matam na travessia para chegar à Europa, fome dantesca na África, apenas para citarmos alguns exemplos óbvios demais.
         Não só por isso, mas também pelos incontáveis e não resolvidos escândalos de pedofilia, abusos, negociatas com bancos e terras, proibição de uso de meios anticonceptivos e campanha contra o aborto, afastada a impossibilidade de a mulher ocupar lugar de destaque na hierarquia, talvez venha perdendo terreno a igreja católica nos corações e mentes dos fiéis.
         Os neopentecostais caminham a passos largos no avanço pela hegemonia religiosa na América Latina segundo os últimos dados censitários, onde acachapante maioria é católica.
         [Outro necessário parêntesis faço, a igreja católica é predominante entre a massa carcerária feminina, tanto entre as presas, quanto entre as agentes.
. Números das presas, em Belo Horizonte, que se declaram católicas é igual a 45%, contra 25% evangélicas/protestantes, confronte-se nosso A VISIBILIDADE DO INVISÍVEL, Belo Horizonte : FMDC, 2008, p. 88.
. Número das agentes, em Belo Horizonte, que se declaram católicas é ainda maior: 66%, contra 35% de todas as outras religiões somadas, confronte-se nosso DE UNIFORME DIFERENTE – O LIVRO DAS AGENTES, Belo Horizonte : FMDC, 2010, p. 42.]
         Um exemplo do mal das religiões, em especial as neopentecostais, foi a árdua tarefa que tivemos em meados da década passada em conter o ímpeto da massa carcerária quando quiseram tirar o “pecúlio” que tinham na “casa” para passar para um pastor neopentecostal que lhes insuflava pelo rádio dizendo que se fizessem isso o Senhor Jesus, do qual ele mesmo possuía não só procuração com amplos poderes como também a contabilidade, mesmo sem inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil – o que é crime previsto no código penal – entraria com um “recurso no processo” (sic) de todas elas, bastando ter fé e, óbvia e necessariamente: fazer o pagamento antes.
         Já são percebidos, em qualquer debate sob religião, aqueles que se declaram “evangélicos não praticantes”, categoria reservada anteriormente apenas aos católicos.
         Nas últimas eleições presidenciais o grande mal produzido pela fé cristã (não excluo os religiosos judaicos, historicamente votantes na direita, qualquer que seja ela) nos custa um preço enorme até hoje.
         O candidato da direita, o fantasmagórico José Serra, travestido de social-democrata, deu de apostar suas fichas – sim, para esse tipo de gente a política não passa de um cassino onde o importante é ganhar, ganhar, ganhar – no segundo turno dizendo-se o candidato do bem (o que é uma meia-verdade, verdade inteira é que sempre foi o candidato dos homens de bens), e que a presidenta Dilma seria a candidata do mal. O que a jogou nos braços dos neopentecostais de forma inapelável, basta vermos as imagens da sua posse.
         Nunca uma imagem foi tão representativa: o feitiço virou-se contra o feiticeiro e sua senhora, em um determinado momento de sua vida, teve que optar por um aborto, o que segue sendo crime nesse país dito de meu deus.
         O aborto, questão introduzida pelo próprio candidato confesso da direita, foi um dos elementos mais significativos para sua derrota. Para citar meu neto, quase sempre muito arguto (não o enganou a neopentecostal conservadora Marina Silva, apresentada como candidata “verde” – as aspas aqui são inevitávies) em suas análises políticas profundas e sintéticas: Bem feito!
         Talvez oportuno darmos de novo voz a Carl Schmitt, um teórico que, na campanha do segundo turno, tanto poderia servir aos neopentecostais, quanto aos protestantes e à própria CNBB que fez um grande desserviço ao país, todos iguais na diferença e o que será que veio fazer nessa discussão Niklas Luhmam, meus deuses?
Vamos de Carl Schmitt:
A ‘privatização’, historicamente considerada, tem suas origens na religião. O primeiro direito individual no sentido da ordem burguesa liberal foi a liberdade de religião.
Ou ainda:
A ciência do Direito pode facilmente assumir uma postura similar à do catolicismo no que se refere à alternação de formas políticas em que ela possa positivamente se alinhar a vários e distintos complexos, desde que haja apenas um mínimo suficiente de forma ‘para estabelecer a ordem.’ Uma vez que a nova situação permita o reconhecimento de uma autoridade, esta fornece uma base para uma ciência do direito - a fundação concreta para uma forma substantiva.
         Foi uma campanha de baixíssimo nível graças, sobretudo, à apelação religiosa, ou melhor; trazer a religião para o debate político o que é um retrocesso, uma excrescência, um absurdo.
         Alguns pontos poderíamos aclarar no debate, penso:
. A ignorância como obra de deus, a fé preenche. A fé como desgraça do demônio é uma contradição em termos: o diabo não é, ou não dizem ser sexo, drogas e rock n’roll? Para a maioria não existe nenhuma ausência de graça nessa tríade do consumo völkisch.
.Assim como o vegetarianismo não-Vegan que pratico, embora não faça apologia ou tente convencer a ninguém, é apenas uma questão de opção, a ausência de religião pode ser considerada como uma religião para que se proteja àquele que não quer sua prática. A propósito: por que um Cristo crucificado em cada sala do Judiciário se o estado é laico?
.A igreja prega na TV, arrecada fundos e não paga impostos, por que só os fiéis pagam dízimos?
. As instituições religiosas não se envergonham da constitucional (Art. 150, VI – b) ordem das limitações do poder de tributar os templos de qualquer culto? Sabemos, imaginamos saber, onde são gastos os vultosos recursos das seitas neopentecostais, mas e o dinheiro da igreja católica, financia exatamente o que no Vaticano? As luxuosas vestes papais? Os escândalos financeiros, exempli gratia  do Banco Ambrosiano? As indenizações nos EUA e Reino Unido devidas pelos abusos dos padres pedófilos ou tudo isso junto?
No chamado “restabelecimento da ordem”, qualquer que seja ela, as religiões cristãs ocidentais, em especial as seitas neopentecostais oriundas dos EUA, sempre estiveram do pior lado, do mais nefasto, que é o fato das igrejas imiscuírem-se na campanha de “demonização” do outro, do diferente, do que não apresenta nenhuma “oportunidade de negócios”.
Para encerrar, oportuna a passagem do Alcorão, 61 (As Fileiras), suras 2 e 3: “Ó vós que credes, por que pregais o que não praticais? É odioso aos olhos de Deus que digais uma coisa e façais outra”.
Ou mesmo a fala de um “teólogo”[7] de quem gosto muito: “Deus, se vier, que venha armado”.
Parece que desde o passado já está dado o recado: a religião deve cuidar da vida dos seus nos limites do divino; no campo do terreno, desde o século XVIII, já temos nossos próprios problemas e não vale a pena agravá-los ainda mais com um preconceituoso e hipotético juízo de deus, já não teriam feito um mal suficiente as Ordálias?
Eram estas as questões de gostaria de trazer ao debate.
Pela atenção da escuta meu muito obrigado.
  


[1] - No ouro eles confiam, aliteração com a inscrição no dólar estadunidense “In God we trust”. Roteiro mínimo de intervenção na FAJE – 20/10/2011.
[2] - Graduado, especialista em ciências penais e mestre em direito pela UFMG. Doutor em Direito pela Università Degli Studi di Lecce (IT). Do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade. Do Fórum Mineiro de Saúde Mental. Autor de Crime e Psiquiatria – Preliminares para a Desconstrução das Medidas de Segurança; SEM RUMO & SEM RAZÃO – Mapeamento dos cidadãos submetidos à medida de segurança em Minas Gerais, dentre outros. Advogado criminalista. virgilio@portugalemattos.com.br
                

[3] Ramischer Katholizismus und politísche Form (1925). Carl Schmítt  - Kletc-Cotta, Stuttgart, 1984, p. 9.

[4] - Refiro-me ao deus cristão ocidental a quem se atribui a paternidade de Iesu Christu, ativista político crucificado após ter sido impiedosamente torturado pelo Estado Romano a mando dos religiosos da elite da época.
[5] - Publicada no Diário Oficial da União n. 19-A, de 5 de outubro de 1988. 
[6] - Extracomunitários pobres. A Suíça e os EUA também são compostos de cidadãos extracomunitários sem o menor problema de entrada na Europa, seja para ir conhecer o Vaticano ou não.
[7] - João Guimarães Rosa. Da fala de Riobaldo, em Grande Sertão – Veredas.