Luta pela
moradia, um dos desafios em 2013.
Gilvander Luís Moreira[1]
Muitas pessoas têm me perguntado: “Como você analisa a situação da moradia no Brasil? Você acha que esta
questão tem sido tratada com prioridade pelos governos?” Respondo: Os governos têm sido mais do que omissos. Têm sido cúmplices da
bárbara injustiça que padece sobre milhões de famílias empobrecidas nas
cidades. As grandes cidades estão sendo tratadas como empresas. Por isso competem
entre elas para ver qual atrai mais empreendimentos do capital. A especulação
imobiliária assola as cidades. Muitas áreas ocupadas pelos pobres há décadas agora
passam a ser consideradas áreas de riscos, mas porque se tornaram áreas de
ricos. O que mais ameaça os pobres não são os riscos geológicos, mas a especulação
e os riscos sociais. É um crime que clama aos céus o imenso déficit
habitacional. Há cerca de sete milhões de famílias sem-casa no Brasil enquanto
há cerca de sete milhões de imóveis ociosos e vazios. Em Belo Horizonte , por
exemplo, falta moradia para mais de 150 mil famílias. Cinco Ocupações urbanas na
capital mineira – Camilo Torres, Dandara, Irmã Dorothy, Zilah Sposito/Helena
Greco e Eliana Silva – construíram (ou estão construindo) nos últimos anos
quase duas mil casas de alvenaria, enquanto o prefeito de Belo Horizonte,
Márcio Lacerda -, que está no PSB, mas é PSDB no DNA - não construiu nenhuma
casa para famílias de zero a três salários mínimos pelo Programa Minha Casa
Minha Vida em quatro anos de primeiro mandato. “Uma pessoa sem casa é como um pássaro sem ninho: voa, voa, mas não tem
onde se assentar”, disse-me uma mãe com lágrimas nos olhos, na Favela
Massari, em São Paulo ,
SP. Injusto também é Minha Casa Minha Vida através de Construtoras. Deveria ser
apenas através de Entidades idôneas que já trabalhavam com os sem-casa. As 20
famílias do Assentamento Pastorinhas, do MST, em Brumadinho, MG, por exemplo,
receberam R$9.700,00 para construir suas casas na agrovila do assentamento.
Reuniram mais uns R$5.000,00 e fizeram 20 casas grandes, bonitas e espaçosas.
Isso demonstra que através de autoconstrução ou em mutirão se pode construir
muito mais casas com pouco dinheiro. No Minha Casa Minha Vida, quem mais ganha
com a construção das casas, via construtoras, são as próprias construtoras.
“Qual a saída para as
famílias que não têm onde morar?”, me perguntam muitos sem-teto. Respondo: Mágica
não existe. Não há saída fácil. Não dá para dar um jeitinho. O caminho correto
a ser trilhado é se unir, se organizar e partir para a luta coletiva. Dizem que
se ficar, o bicho come. Se correr, o bicho pega. Mas, se unir, se organizar e
partir para a luta, o bicho some. Assim
expulsamos os opressores dos pobres. A experiência das cinco ocupações, citadas
acima, demonstra que quase duas mil famílias, na luta e na raça, se libertaram
da cruz do aluguel e da humilhação da vida de favor. Estão construindo suas
casas, na luta, na raça, com garra e fé no Deus da vida, em si mesmo e nos/as
companheiros/as. Quem continuar lutando sozinho será morto aos poucos. Não
nascemos para viver em-pregado, pregado, pregado, ganhando só um salário mínimo,
que é só o sal, para renovar as energias e continuar sendo sugado pelos
capitalistas e pelo deus mercado. Não! Nascemos para ser livres e emancipados!
Ser livre é difícil, mas é necessário e possível! Jamais os opressores podem
libertar os oprimidos. Somente os oprimidos, em comunhão, se libertam. Temos
que fortalecer o sentimento de pertencimento à classe trabalhadora que é
oprimida pela classe dominante.
Outros questionam: “Temos
assistido a um aumento da repressão aos movimentos de moradia e às ocupações
urbanas. Por que isso?” Temos que entender como a Classe dominante se
relaciona com os pobres: adora os pobres enquanto esses estão ajoelhados, de
mãos estendidas, se contentando com migalhas, e, no mundo do trabalho,
oferecendo seu suor e sangue para construir tudo o que existe e movimentar a
cidade. Mas quando os pobres se unem, se organizam, metem o pé no barranco e se
rebelam como fez o povo da Bíblia escravizado pelo imperialismo dos faraós no
Egito, como fez Jesus de Nazaré ao pegar um chicote e expulsar os vendilhões do
templo, como fez Zumbi dos Palmares, Dandara, Gandhy, Luther King, Che Guevara
e tantos outros, os poderosos tremem de medo do seu edifício da opressão se desmanchar
como um castelo de areia. Por isso fazem campanha permanente de difamação,
criminalização e satanização dos pobres e de quem luta ao lado deles. A classe
dominante sabe que precisa criar uma cortina de fumaça que impeça os pobres de
identificar seus reais algozes. Os poderosos sabem muito bem que quando os
pobres se descobrirem como classe social oprimida e identificarem quem, de
fato, são seus opressores, nesse dia, adeus opressão. As vítimas golpeadas pelo
capital não serão mais vistas como pessoas violentas.
Nosso Deus - o Deus solidário e libertador - está na guia do
movimento popular e de todas as forças vivas da sociedade que conspiram pela
construção de uma sociedade que caiba todos e tudo, se relacionando de forma
justa e solidária. Não podemos nos omitir diante de tantas injustiças. Não
incomoda quem fica só consolando, fazendo assistência social, filantropia. Quem
luta por justiça incomoda os poderosos e, por isso, eles partem para ameaças. A
História nos ensina: só faz história libertadora quem anda na contramão
atrapalhando o sábado. Assim aconteceu com Jesus de Nazaré, com Gandhy, Luther
King, Che Guevara, Zumbi, Dandara, as mães da Praça de Maio, em Buenos Aires
etc, mas são esses incompreendidos e perseguidos que constroem a verdadeira história.
Somos milhões conspirando a construção de uma sociedade socialista, justa e
sustentável ecologicamente.
Algumas lideranças me pedem um conselho: “Que recado você dá para as famílias sem-teto
que estão na luta para conquistar o direito humano de morar dignamente?”
Aconselho: Sintam-se
abençoados/as pelo Deus da vida. A luz e a força divina brilham em vocês! Não
desanimem nunca da luta coletiva! Só perde quem não entra na luta coletiva ou
quem desiste da luta! Cultivemos a amizade, o companheirismo, nos apoiemos
mutuamente. Um fraco + um fraco + dois fracos = quatro fortes. Se ficarmos
isolados, pensando só no nosso umbigo, só na nossa família, morreremos aos
poucos, mas se nos juntarmos, construiremos uma nova aurora, com justiça e paz,
com reformas urbana e agrária, com sustentabilidade ecológica, com direitos
humanos.
Belo Horizonte,
MG, Brasil, 14 de janeiro de 2013.
[1]
Frei e padre da Ordem dos carmelitas; licenciado e bacharel em Filosofia pela
UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo
Pontifício Instituto Bíblico de Roma; doutorando em Educação pela FAE/UFMG;
assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina; conselheiro do Conselho Estadual
dos Direitos Humanos de Minas Gerais – CONEDH; e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br
– www.gilvander.org.br – www.twitter.com/gilvanderluis -
facebook: Gilvander Moreira
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