MILITANTES NÃO MORREM, FICAM ENCANTADOS
Virgílio de Mattos
Confesso-lhes
que a notícia me pegou como uma patada no estômago. Fiquei triste o resto do
dia e me perguntando, como sempre faço em momentos como este: como é que tem tanto filho da puta - com
todo o respeito que me merecem as putas –
com boa saúde e um companheiro desses morre?
A
última vez que o vi foi no final de maio de 2010 e ele estava bem. Aliás, o
título da entrevista que a revista FORUM (n. 101) publicou foi exatamente este:
ESTAMOS TODOS BEM, quando lhe perguntei sobre a sua ex-companheira e os filhos
dela sequestrados junto com ele por uma operação conjunta entre o serviço de
informações uruguaio e o DOPS de Porto Alegre, nos tempos ainda mais sombrios
de Operação Condor.
Universindo
Diaz, como o conhecemos no Brasil ou Universindo Rodriguez, como o conhecem no
Uruguay, me pareceu alegre, bem disposto, ágil de corpo e mente e com um senso
de humor difícil de encontrarmos no Uruguay, principalmente entre os
militantes, sempre tão literais e sisudos.
Em
2011 ainda tentei trazê-lo de novo ao Brasil para que fizesse o encerramento do
IVº Seminário Antiprisional Desconstrução das Práticas Punitivas e ele declinou
amavelmente, depois de minha irritante insistência, tanto com ele, quanto com
os amigos dele. Tinha outras tarefas.
Ele
era assim: um sujeito simples e extremamente corajoso. Desde o exílio na Suécia
resolveu voltar e tornar a arriscar a vida – já havia arriscado tudo mesmo – no
Cone Sur. Sabia bem dos riscos e das
consequências. Resolveu arrostar todos e todas, riscos e consequências
entenda-se.
Seu
endereço eletrônico trazia o seu número de prisioneiro no penal Libertad. Memória e luta. Trabalhava em
um bom lugar e se orgulhava da pesquisa de história oral que realizava, aliás
foi a desculpa que utilizou para não vir ao Brasil no seminário: coincidência
de datas.
Coincidência
de tragédias, o filho de camponês do norte do Uruguay não pôde formar-se em
medicina, como sonhava na juventude. Formado historiador sua história se
confundiu com a nossa história e a história dos lutadores por dias melhores,
por menores que sejam as chances.
Universindo
Rodriguez Díaz foi um exemplo, sobretudo de humildade para as gerações mais
novas. Pessoas como ele fazem falta em um mundo tão perverso e sombrio como
este que temos a infelicidade de habitar.
Militantes
como ele não morrem, ficam pra sempre encantados como uma estrela. Uma estrela
vermelha no firmamento.
Queria
te dizer, meu chapa, que você deixa tristeza e saudades, mas sobretudo o
exemplo – tão firme, tão digno – de luta. Com sua ausência não ficamos nada
bem.
Busco
consolo em Mário Benedetti, um poeta querido em comum:
Lento pero viene
El futuro se acerca
Despacio
Pero viene.
A hora dos nossos
inimigos comuns está por chegar, pena você não estar mais por aqui pra
enxergar.
Vai
na paz!
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